“Todas as vossas coisas sejam feitas na caridade, assim poderemos superar todas as dificuldades que inumeráveis devemos experimentar dia após dia; e assim teremos as forças para gerar Cristo em nós e nos outros.”
Essas palavras não só ecoam como um testamento na boca de São Carlos Borromeu, tendo sido pronunciadas por ele no último sínodo diocesano, mas revelam também a santidade alcançada por um homem que, por caráter era levado mais à severidade do comando que à doçura da persuasão.
Seus genitores, Gilberto Borromeu e Margarida de Medici, eram proprietários da fortaleza de Arona e das terras em torno do lago Maggiore, na Itália do norte. Eram pessoas nobres e muito bem consideradas, porque Gilberto tratava bem seus serviçais, dependentes e Margarida, pessoa profundamente religiosa, inteiramente dedicada à família e aos pobres, não o era menos. Em Arona nasceu primeiramente Frederico, seguido de Carlos, a 2 de outubro de 1538, e de outras quatro filhas.
DESTINADO À CARREIRA ECLESIÁSTICA
Segundo o costume do tempo, Frederico estava destinado a continuar o nome da família, ao passo que Carlos devia empreender a carreira eclesiástica. Se a vocação para essa vida não o atraísse, devia procurar um jeito de fazer fortuna; por esse motivo, aos 7 anos já estava incluído dentro no clero milanês. Para as meninas devia-se procurar um bom partido no matrimônio (2. Do discurso pronunciado por São Carlos no último sínodo diocesano, presidido por ele, na sua arquidiocese de Milão. Cf. Acta Ecclesiae Mediolanensis, 1599, 1178.) se não quisessem entrar para um convento. Eram problemas, esses, que naquele momento não interessavam aos meninos que cresciam em um clima de grande tranquilidade. Infelizmente sua alegria foi perturbada pela morte prematura da mãe, em 1547, uma tristeza que não durou muito tempo, porque o pai voltou a casar-se, com a marquesa Taddea, que também tinha enviuvado, e ela para os filhos do conde foi verdadeiramente uma mãe.
PASTOR NO MEIO DO SEU POVO
Carlos Borromeu, mesmo sendo um hábil organizador, não se contentou em comandar do seu quartel-general, mas foi um pastor no sentido mais concreto da palavra, visitando pessoalmente as paróquias e mantendo contato direto com os seus padres e com o povo. Apenas um ano depois do ingresso na diocese, em 1566, começou a visita pastoral, iniciando com as paróquias das cidades no tempo quaresmal e prosseguindo um ano depois com as paróquias rurais, durante o verão, por motivo de viabilidade.
PROMOTOR DO LAICATO
Carlos Borromeu, mesmo dando uma grande importância ao papel do clero segundo as diretrizes tridentinas, deu igualmente um forte impulso – como era possível no seu tempo – ao apostolado dos leigos, não só no campo estritamente religioso como no campo das associações leigas, mas promovendo para eles o mundo da cultura. Se em Roma havia fundado as “Noites Vaticanas” e havia dado impulso aos estudos de arqueologia, merecendo a seguir o título de cofundador dessa disciplina, na sua província eclesiástica favoreceu o surgimento de vários centros de estudos e de numerosos colégios mantidos por religiosos, especialmente teatinos e jesuítas. Como arcebispo fundou em Pávia o Almo Collegio, que ainda hoje traz o seu nome, e, em Milão, a Universidade de Brera, com as faculdades de Letras, Filosofia e Teologia.
A ação pastoral de Carlos Borromeu não se deteve dentro dos limites da arquidiocese de Milão, onde celebrou cerca de onze sínodos diocesanos, mas teve sua benéfica influência também sobre as quinze dioceses do Piemonte, da Lombardia e da Ligúria, das quais ele era metropolita. Nelas fez suas visitas canônicas e para elas organizou seis concílios provinciais, sempre visando à aplicação do Concílio Tridentino.
Sua obra de reforma encontrou também oposição tanto no campo religioso, por parte de algumas ordens religiosas, quanto de algumas autoridades civis. Um frade da Ordem dos Humilhados disparou-lhe um tiro de fuzil enquanto estava em oração na sua capela particular, mas Borromeu saiu ileso, aumentando a admiração dos diocesanos, que viram no triste episódio uma intervenção miraculosa e uma confirmação do alto à sua linha pastoral reformista. Por ocasião de um carnaval, desentendeu-se também com o governador espanhol da cidade, mas, na queda do braço de ferro, o arcebispo teve a melhor, porque até mesmo a mulher do governador proibiu aos seus filhos de participar das festas mundanas organizadas pelo pai.
ANJO ENTRE OS ATACADOS PELA PESTE
O afeto do povo pelo seu pastor atingiu o ápice durante a peste que grassou em Milão, em 1576. Assim que se esparramou a notícia do aparecimento da terrível doença, o governador da cidade fugiu com toda sua família, enquanto o Arcebispo Borromeu, que se encontrava em visita pastoral fora da cidade, apressou-se a retornar e começou logo a organizar os socorros, empenhando todos os recursos da diocese e vendendo até mesmo o principado de Oria, na Apúlia, que fazia parte do seu patrimônio familiar. Nesse apuro, tão doloroso para os milaneses, seu arcebispo foi o único ponto de referência e de conforto. Ele publicou um diretório para a assistência aos atacados de peste e ele próprio, além de empenhar os bens materiais, colocou-se entre os doentes para assisti-los e confortá-los. Sua dedicação era tal a ponto de suscitar as preocupações do Papa, que temia pela sua saúde. A peste foi superada e Milão retomou sua vida normal, mas a vida de Borromeu já estava minada pelas fadigas suportadas sem descanso.
Estava fazendo os exercícios espirituais em Sacro Monte di Varallo, aqueles exercícios que em Roma lhe haviam inundado a alma de luz, assinalando a virada decisiva da sua vida, quando foi surpreendido por uma febre persistente. Quis voltar para Milão, enfrentando uma viagem incômoda, e morreu poucos dias depois na sua sede, a 3 de novembro de 1584. Em 1º de novembro de 1610, Paulo V declarou-o santo, apresentando-o como modelo a todos os pastores da Igreja.
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