Ter uma vida marcada pelas virtudes, vivendo-as de forma heroica, amando Jesus e os irmãos a ponto de, se preciso, sofrer o martírio. Essa é, basicamente, a jornada para ser considerado santo e ter a honra de ser elevado aos altares da Igreja Católica.
Entretanto, a santidade excede o número das canonizações. É preciso recordar com esperança todos os que já estão na glória celeste. Incontáveis são as pessoas comuns que passaram a vida fazendo o bem e seguindo a Jesus Cristo, modelo perfeito a ser imitado
Por isso, em 1º de novembro, a Igreja celebra a Solenidade de Todos os Santos, festa litúrgica que comemora aqueles que viveram na fidelidade à graça de Deus, para além do reconhecimento oficial. Esse dia ajuda a compreender que cada batizado é chamado a viver a santidade cotidianamente.
“A santidade é o rosto mais bonito da Igreja, o aspecto mais belo: é redescobrir-se em comunhão com Deus, na plenitude da sua vida e do seu amor”, destacou o Papa Francisco em audiência-geral em 19 de novembro de 2014. Nas palavras do Pontífice, a santidade não é privilégio de alguns, é um dom oferecido a todos, sem excluir ninguém, por isso constitui a marca de cada cristão.
A data foi instituída no ano 835 d.C. pelo Papa Gregório IV para honrar os fiéis católicos já falecidos, mas que não eram lembrados no calendário litúrgico. A solenidade é reconhecida tanto pelos católicos quanto pelos ortodoxos, anglicanos e luteranos.
Essas palavras, pronunciadas em 1991 por São João Paulo II (canonizado em 2014), durante a beatificação de Madre Paulina, ainda ecoam fortemente no coração dos brasileiros.
Na ocasião, o Pontífice refletia sobre como o Concílio Vaticano II reafirmou a santidade como um chamado para todos, realidade presente na Igreja, em cada um dos estados de vida, gerando frutos de justiça e paz.
Em entrevista à Revista Ave Maria, Dom Jaime Vieira da Rocha, arcebispo de Natal (RN) e presidente da Comissão Especial para a Causa dos Santos da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), falou sobre essa vocação universal: “Não podemos deixar de relevar que a santidade também se faz presente nos homens e mulheres, leigos, religiosas e clérigos no dia a dia de suas vidas, nas missões eclesiais e no meio da sociedade em que vivem a santidade fundamental da Igreja, construindo as realidades de justiça e de paz tão necessária no mundo de hoje”.
Segundo o arcebispo, os santos canonizados tornam-se (e queira Deus que em maior número aconteçam!) modelos para os que formam a Igreja peregrina, pessoas que viveram a nossa realidade. “São conterrâneos nossos e conseguiram alcançar o que todos nós somos chamados pelo Senhor: ‘Sede Santos’!”.
Na opinião de Dom Jaime, quando se fala dos santos canonizados pela Igreja o número de brasileiros é ainda pequeno se comparado com a fé e a devoção do povo.
Considerando os que nasceram ou atuaram no Brasil temos oficialmente 37 santos. A mais recente, canonizada em outubro de 2019, foi a freira baiana Santa Dulce dos Pobres (1914-1992). Conhecida como o “Anjo Bom da Bahia”, passou a vida se dedicando à caridade, sobretudo aos doentes e mais necessitados.
Na lista dos nascidos no Brasil estão: santos André de Soveral, Ambrósio Francisco Ferro, Mateus Moreira e seus 27 companheiros leigos (Mártires do Rio Grande do Norte), São Roque Gonzales, Santo Afonso Rodrigues e São João de Castilho (mártires do Rio Grande do Sul) e Santo Antônio de Sant’Ana Galvão (o primeiro brasileiro canonizado, em 2007, pelo Papa Bento XVI).
E mais os que não nasceram no Brasil, mas viveram sua fé neste território: São José de Anchieta (nascido na Espanha) e Santa Paulina do Coração Agonizante de Jesus (nascida na Itália).
Além desses 37 já canonizados, o Brasil tem atualmente 52 beatos, 16 veneráveis e 73 servos de Deus. Nem todos são brasileiros natos, mas atuaram pastoralmente no Brasil, onde gastaram as vidas. Esses são dados investigados por um levantamento do professor Fernando Altemeyer Júnior, chefe do departamento de Ciência da Religião da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
O processo em que se proclama um beato como santo é gradativo, com diversas etapas, e cada uma com suas particularidades, o que inclui desde a investigação da vida do candidato até a confirmação de milagres por sua intercessão. Em resumo, é preciso solicitar a abertura da causa, eleger um responsável que acompanhará o processo, iniciar a investigação da vida do candidato (provas de virtudes e fama de santidade). Aprovada essa fase, a Congregação da Causa dos Santos do Vaticano autoriza o início do processo, o servo de Deus se torna venerável. Em seguida, se comprovado um milagre realizado após a morte, ele está apto a se tornar beato; atestado um segundo milagre, desta vez após a beatificação, enfim o candidato será canonizado, isto é, declarado santo.
Mestre em Direito Canônico, Padre Reinaldo Torres, da Arquidiocese de São Paulo (SP), concedeu entrevista à nossa reportagem e explicou sobre sua vivência quando foi notário nas causas de canonização de Santo Antônio de Sant’Ana Galvão e da candidata a Beata Ginetta Caliari. “O mais tocante foi a experiência de aproximar-me da vida e da história de pessoas que marcam a trajetória de fé de tantas outras. À medida que o processo avança, vamos descobrindo sinais de como se pode viver a dimensão da santidade no cotidiano da vida, na simplicidade, na firmeza da fé, no abandonar-se nas mãos de Deus”, explica Torres.
Segundo o sacerdote, em ambas as causas foi perceptível quanto Deus age amorosamente na vida das pessoas que se sentem tocadas por sinais de graça e de bênção: “Eu diria que tanto Frei Galvão quanto Gineta Calliari me colocaram mais próximo de Deus e dos irmãos”.
Ao comentar sobre as pessoas que viveram uma vida santificada, ainda que não canonizados, o presbítero afirma que o grande tesouro da santidade é o despojamento de si mesmo para viver em tudo as exigências do Reino: “Assim sendo, inúmeras pessoas poderiam ser elencadas pela dimensão da fidelidade a Deus e ao Evangelho, na força do Espírito Santo. Cito alguns exemplos: Dom Héelder Câmara, Dom Paulo Evaristo Arns, doutora Zilda Arns, Frei Damião, Padre Ibiapina, Padre Cícero, Irmã Dorothy Stang, entre outros”.
Padre Reinaldo conclui que a santidade é buscar a Deus de coração sincero e, nesse sentido, não faltam bons exemplos: “Que o Brasil seja terra de santos e santas, para nos fazer ver que o amor a Deus e ao próximo é como uma mola que nos impulsiona para vivermos como filhos e filhas de Deus Pai”.
Conhecido entre os católicos por interceder junto a Deus e atender a causas justas e urgentes, Santo Expedito era um soldado romano que levava uma vida desequilibrada até mudar de caminho e começar a seguir os passos de Jesus Cristo. Pregou o Evangelho e converteu muitos dos seus colegas combatentes romanos. Perseguido e forçado a renunciar à sua nova fé, o que ele não fez, sofreu flagelos, foi decapitado com espada e morto em 19 de abril de 303 em Melitene, na Armênia.
Sua devoção é uma das que mais cresce no Brasil e arrasta multidões todo dia 19 aos santuários e paróquias dedicados ao santo. Denis José de Alencar, 40 anos, de São Paulo, é um desses devotos.
Da fé herdada de seus avós, conheceu o santo das causas urgentes em sua paróquia de origem, que todo dia 19 fazia missas em louvor a Santo Expedito: “A partir daí nasceu em mim a vontade de conhecer mais sobre a vida e a história desse santo. Fui com minha família conhecer a Capela Militar de Santo Expedito, no bairro Tiradentes, aqui em São Paulo. Fiquei encantado com a beleza da igreja e a biografia do santo”, recorda.
O analista financeiro sênior passou a frequentar assiduamente as celebrações dedicadas a Santo Expedito e o invocar nas horas de angústia: “Entre o fim do ano de 2013 e o início de 2014, passei um momento conturbado na vida profissional, perdi muito peso, tive depressão. Eu não tinha vontade de fazer as coisas e muito menos trabalhar; pedi ajuda de Santo Expedito para que me desse forças para sair daquela situação”, conta.
Alencar recorda que logo após o pedido ao santo foi demitido do emprego onde trabalhou durante oito anos: “Ainda que parecesse algo estranho para alguns, esse acontecimento foi bom para mim, pois aquela situação me consumia e destruía por dentro”. Algum tempo depois, também invocando Santo Expedito, ele conseguiu um novo emprego, sempre recorrendo a ele nas necessidades. “Graças a Deus e às intercessões de Santo Expedito e Nossa Senhora Aparecida, sou grato a tudo que tenho e sou”, encerra.
Em abril de 2018, o Papa Francisco presenteou os católicos com a sua Exortação Apostólica Gaudete et Exsultate. Num mundo que apresenta tantos desafios à fé, o Sumo Pontífice dá indicações de como viver a santidade, que é um chamado universal. Leia mais em bityli.com/topehI.
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