Diante da finitude dos seres vivos, as notícias de morte serão permanentes. Podemos e devemos diminuir aquelas causadas pela falta de cuidado, de desprezo pela vida, pela violência. Sonhamos em ouvir somente notícias de morte natural, mas nem essas gostaríamos de ouvir.
Levar a sério a morte é sinal de valorização da vida. É importante falar sobre ela. A morte é uma realidade que não se conforma com a superficialidade. Não pode ser ignorado o fato existencial do medo de morrer e a sua imprevisibilidade. O medo vem acompanhado com a angústia. Jesus, diante do túmulo do amigo Lázaro, estremeceu por dentro, ficou agitado e chorou. Na véspera de ser crucificado, manifestou a sua angústia e medo. No alto da cruz, sentiu-se abandonado.
“Vós não precisais ter medo! Sei que procurais Jesus, que foi crucificado. Ele não está aqui! Ressuscitou, como havia dito!” (Mt 28, 5-6) A ressurreição de Jesus Cristo lançou sobre os nebulosos desejos humanos de imortalidade uma nova e grande luz. A limitada condição humana, marcada pela morte, pôde ser vista sob nova perspectiva. Os seguidores de Cristo podem professar: “Eu creio na vida eterna!”. Essa convicção influencia a compreensão da vida e da morte.
O desejo da vida eterna desperta para a vigilância. Não se vive para a morte e sim para a vida.
Viver é também conviver com a ideia de que tudo, agora ou mais tarde, acabará. A morte se faz presente em cada instante da vida. O comportamento evangélico da vigilância fundamenta assim uma ética do discernimento: quem espera o Senhor sabe que é chamado a viver responsavelmente cada ato na presença de seu Deus.
A fé na vida eterna faz o cristão viver na esperança. A esperança não é somente a espera de um bem futuro, é antecipação das coisas futuras prometidas e já doadas pelo Senhor. “Na esperança, o hoje se abre para o horizonte da eternidade e a eternidade vem colocar as suas tendas no hoje; graças à esperança, o tempo quantificado (que nunca nos é suficiente, que é sempre muito pouco) torna-se tempo qualificado, hora da graça, tempo favorável, hoje da salvação, momento degustado na paz” (Cardeal Martini).
A pandemia do novo coronavírus impediu a celebração digna das exéquias ou funerais. A Igreja, na sua sabedoria de mãe e mestra, por meio do ritual das exéquias, participa da vida dos fiéis no luto. As exéquias têm em vista exprimir o caráter pascal da morte cristã. É anunciada à comunidade reunida a vida eterna e, simultaneamente, realça a provisoriedade da vida terrena.
As exéquias têm por finalidade ser presença consoladora e fraterna junto aos familiares enlutados e anúncio pascal da ressurreição, sendo que elas são mais úteis aos vivos do que aos mortos. A dor dos familiares, uma dor que não dá para quantificar, desperta compaixão.
O ritual das exéquias cristãs, além das orações, propõe o uso de símbolos e ritos para consolar e evangelizar. O roxo dos paramentos litúrgicos expressa a misericórdia. O círio pascal aponta para o Cristo ressuscitado. A cruz leva ao crucificado. A Bíblia mostra que a Palavra de Deus foi luz para os pés do peregrino falecido. As flores falam dos sentimentos dos enlutados, expressando dor e esperança de vida. O incenso é um sinal de respeito ao corpo, templo do Espírito Santo. A água benta traz presente o Batismo. As procissões recordam a vida de peregrinos na terra e que a morte é uma viagem para a eternidade.
Dai-lhes, Senhor, o repouso eterno. E brilhe para eles a vossa luz. Descansem em paz. Amém.
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