Nos evangelhos, verifica-se esta afirmação: “Jesus anunciava a Palavra usando muitas parábolas como estas, conforme eles podiam compreender” (Mc 4,33). A palavra “parábola” é a junção de dois vocábulos gregos: “bállo” = colocar e “para” = ao lado de. Parábola é, então, “colocar ao lado de” algo mais. Coloca-se ensinamento de vida.
A parábola apresenta uma história dentro de outra história. Fala do cotidiano, da vida prática. O ensinamento, a mensagem transmitida é de forma velada, indireta e tem como objetivo gerar reflexão, aprendizado, fazendo comparação entre o Reino de Deus e a vida.
Em Lucas aparecem 29 parábolas das quarenta que são narradas nos evangelhos sinóticos – Mateus, Marcos e Lucas –, sendo que dezesseis são narradas somente por Lucas.
Elas fazem parte do ensinamento de Jesus aos seus discípulos a caminho de Jerusalém (cf. Lc 9,51–19,28).
A primeira é a parábola do bom samaritano (cf. Lc 10,25-37), o caminho da compaixão e misericórdia. Um legista, especialista em leis, indaga a Jesus: “Quem é o meu próximo?” (Lc 10,29). A resposta vem por meio de uma parábola. O ambiente é o caminho entre Jerusalém e Jericó. O caminho é perigoso e um homem é vítima de assaltantes que o roubam e o espancam, deixando-o semimorto. Passam por esse caminho um sacerdote e um levita que, seguindo a lei que prescrevia a obrigação da pureza, devem evitar o contato com cadáver, pessoa ferida e com sangue (cf. Lv 21,1-3), veem-no, porém, seguem adiante, pois devem prestar serviço ao templo. No contexto, como a maioria das pessoas eram consideradas impuras, o grupo dos puros era, consideravelmente, demarcado. Nesse mesmo caminho passa um samaritano que, ao ver o homem caído, move-se de compaixão. Judeus e samaritanos conservavam uma rixa que vinha desde 722 a.C., quando os assírios invadiram o reino do norte, deportaram parte da população e trouxeram pessoas de outras cinco regiões e nacionalidades diversas: da Babilônia, de Cuta, de Ava, de Emat e de Sefarvaim (cf. 2Rs 17,24). Devido às uniões (casamentos) que ocorreram foram considerados impuros pelos que habitavam o sul e a rivalidade foi aumentando com o tempo, sobretudo com a promulgação das leis referentes à pureza.
A parábola obriga os ouvintes a uma reflexão profunda e conversão, pois exatamente um que é considerado impuro é capaz de compaixão, empenha-se nos cuidados. Não é revelada a identidade da pessoa que está ferida. A compaixão, o amor entranhado, supera toda e qualquer barreira e vence as distâncias, levando a gestos e atitudes concretas para com quem está à beira do caminho e necessita de ajuda.
Antes questionado, Jesus agora é quem dirige a palavra: “Qual dos três, em tua opinião, foi o próximo do homem que caiu nas mãos dos assaltantes?” (Lc 10,36). A questão não está em quem é meu próximo e sim de quem eu me faço próximo. Assim, o legista deve refletir interiormente e, finalmente, admitir: “Aquele que usou de misericórdia para com ele” (Lc 10,37).
A compaixão nos coloca no caminho de Deus, no projeto da construção do Reino aqui e agora. A lei deve servir à caridade, ao amor, e não ao contrário. Por meio desse ensinamento, os membros da comunidade cristã são chamados a colocar em prática o amor misericordioso de Deus, ter um coração sensível para com os que sofrem: “Vai, e também tu, faze o mesmo” (Lc 10,37).
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