Deus ouviu o clamor do povo no Egito. Por isso, falou com Moisés no monte Horeb para ele libertar o povo hebreu da escravidão (Cf. Êxodo 3,1-15). Mas o deserto, cheio de percalços, deveria ser atravessado para esse povo chegar à libertação e possuir sua terra. Na caminhada faltaram água, comida e conforto. O povo sempre reclamava. Até se arrependeu de deixar a escravidão por ter que passar por sacrifício tão grande, o da caminhada até conquistar seu objetivo libertador.
Todo ser humano tem direito à vida digna. Porém, quem a outorga? É algo já pronto ou a se conquistar e com a ajuda de quem? Há os privilegiados momentâneos, que, sem esforço, com meios lícitos e até ilícitos tudo conquistam. Há os corruptos e corruptores. Os que não têm compromisso com o semelhante, julgando que não têm a prestar contas a ninguém. Não se lembram do que Deus disse a Moisés: “Eu vi a aflição do meu povo que está no Egito e ouvi o seu clamor por causa da dureza de seus opressores. Sim, conheço os seus sofrimentos” (Êxodo 3,7). Ninguém pode se esquecer, querendo ou não, que, atrás da vida de cada um, está o doador da mesma. Ele a quer ver desenvolvida com amor. Sem o amor o ser humano torna-se como pedra, sem compaixão para com o semelhante. Quem acumula demais para si e não ajuda a tirar o sofrimento e as injustiças em cima dos que sofrem e não têm oportunidade de vida digna, não é pessoa humana e sim desumana. O Filho de Deus veio para nos resgatar da vida sem sentido e nos ensinar que, só nos realizamos, dando de nós para a realização do próximo. Assim vivemos como pessoas de grandeza de caráter e de alma.
O lema da Campanha da Fraternidade nos lembra sobre o direito, que brota da fonte da justiça (Cf. Amós 5,24). Justamente na promoção da justiça fazemos valer o direito de todos. Ninguém tem o direito de ter tudo para si sem fazer com que os outros tenham ao menos o direito de viver com dignidade. Enquanto isso não acontecer para todos, temos que ir dando de nós, mesmo com o sacrifício da vida, para que os outros vivam como gente, ou seja, como filhos e filhas de Deus. Lutar pela promoção da justiça pessoal e social é viver a fé comprometida em dar vida. Por isso, é preciso promovermos mentalidade e prática de justiça em pequenas e grandes coisas, superando o jeitinho antiético de burlar o direito dos outros para valer nossa vantagem pessoal. A promoção de políticas públicas deve ser uma cruzada de todos, para fazermos valer o direito dos pequenos e injustiçados. Saber eleger para cargos públicos quem tem a consciência e a prática da justiça é fundamental!
A Quaresma é tempo propício para revermos nosso seguimento a Jesus Cristo, questionando-nos se realmente colocamos em prática o amor e a justiça misericordiosa. Deus no-lo traz para vivermos realmente como irmãos. Assim realizamos o projeto de Deus, fazendo desta terra um reino de justiça e de direito para todos terem vida abundante. Isso faz acontecer, de fato, a Páscoa em nós, para darmos a todos a vida do amor de Deus.
Na conversão pessoal e comunitária, voltamo-nos para aquele que é verdadeira fonte da justiça e amor. Ele nos acolhe, como na parábola do filho pródigo (Cf. Lucas 15,1-32). Mesmo se tivermos saído do caminho, é hora de voltar, para utilizarmos nossa vida fazendo o bem e levando os outros a se aproximarem da fonte da justiça e da salvação!
Por Dom José Alberto Moura – Arcebispo de Montes Claros (MG)
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