“A verdade vos libertará” (Jo 8,32): este tem se tornado um jargão social, infelizmente não raramente pronunciado sem compromisso com aquilo que anuncia e encerra. Atualmente, a verdade tem sido deturpada e a mentira paulatinamente tem vestido as suas vestes, tentando passar-se por ela.
As mídias sociais têm contribuído para isso. As notícias, verdadeiras ou não, propagam-se numa velocidade jamais vista. Se por um lado isso pode ser percebido como um processo de democratização à informação, por outro torna-se ferramenta de disseminação de notícias falsas e deturpação da realidade.
Embora essa situação seja forte em nossos dias ela não é exclusividade dos nossos tempos. A história do povo de Deus está marcada por pessoas que tiveram sua paz roubada pela perversidade daqueles que anunciam mentiras como se verdades fossem. Recordemos da história de José, que é vendido pelos irmãos e tem sua morte falsamente anunciada ao seu pai, Jacó (cf. Gn 37); da casta Suzana (cf. Dn 13), honesta mulher que, por não ceder aos desejos daqueles perversos homens, é acusada injustamente; podemos falar ainda da mulher que é levada até Jesus sendo acusada de adultério (cf. Jo 8,1-11).
Nos dois casos mencionados – José e Suzana – a mentira está escancarada. No caso da mulher levada até Jesus, cabe-nos fazer uma reflexão sobre a situação. Basta uma leitura minuciosa do texto para percebermos que não há confirmação de que ela realmente havia cometido o pecado do qual era acusada. Outro fato interessante é o de que o homem que supostamente também estaria envolvido no adultério não é mencionado no texto. Isso nos leva a indagar sobre a veracidade daquela acusação. Além desses dados, não se pode desprezar o fato de que o evangelista deixa explícito que os acusadores buscavam meios para incriminar Jesus.
Hoje, passados alguns milênios entre a história de José do Egito, de Suzana, da mulher acusada de adultério e a nossa, a mentira continua sendo propagada como verdade.
Diariamente, nas mais diversas mídias sociais, a mentira é repassada de mão em mão, ganhando tônica de verdade, fomentando o ódio, maculando a moral de alguém, encobrindo a podridão de outros e alimentando o que há de pior em cada um de nós. A cada mensagem repassada sem o mínimo de cautela e responsabilidade, homens e mulheres são condenados à exclusão, ao popular e em alta “cancelamento”. Pessoas, as mais públicas ou anônimas, têm sua moral ofendida sem a menor chance de defesa.
Recordando o Mestre de Nazaré, podemos dizer que Ele foi e continua sendo o Homem da Verdade. Ele mesmo disse: “Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida” (Jo 14,6). Nós, que somos os seus seguidores, não podemos fazer diferente.
Toda a nossa vida deve ser orientada pela verdade, pela transparência e, sobretudo, pela verdade do amor, da entrega e da doação que emanam do Cristo.
Não nos deixemos levar por nossas verdades, por aquilo que nos convém que seja verdade ou ainda por aquilo que desejamos que o seja. A verdade ela é uma só, aquela que é promotora de vida e dignidade, que emana do Cristo e nos conduz ao encontro de vida fraterno com os irmãos.
Estejamos atentos para não nos comportarmos como os irmãos de José, os acusadores de Suzana ou os pudicos do tempo de Cristo. Deixemo-nos guiar pela verdade e a transmitamos, pois somente a verdade comprometida com a imparcialidade, com a justiça, com a vida é que nos libertará.
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