Por ocasião dos 150 anos do nascimento de Santa Teresa do Menino Jesus o papa Francisco escreveu uma exortação apostólica sobre a sua espiritualidade e doutrina. Como devotos de Teresa queremos também aprofundar nosso conhecimento sobre sua vida e seus ensinamentos, por isso, estudaremos a exortação apostólica sublinhando temas que podem ser uteis para o nosso crescimento espiritual.
No dia 15 de outubro de 2023 o papa Francisco nos presenteia com uma exortação apostólica sobre a confiança no Amor Misericordioso de Deus. “Só a confiança” foi o tema escolhido pelo papa, “só a confiança, nada mais que a confiança” e com isso, já no início, nos deixa uma mensagem muito significativa, afinal, quando Teresa foi proclamada Doutora da Igreja levantara-se muitos questionamentos sobre a sua doutrina colocando em discussão se era digna de um título tão importante. O papa Francisco diz que somente essa afirmação de Teresa seria o bastante para declará-la Doutora da Igreja: “só a confiança, nada mais que a confiança”. Uma frase que foi extraída da carta 197 escrita no dia 17 de setembro de 1896 à Irmã Maria do Sagrado Coração que era irmã de sangue de Teresa (Maria) e sua madrinha de batismo, as duas nutriam uma grande intimidade e foi justamente à Maria que Teresa dedicou o Manuscrito B onde relata seu caminho espiritual.
Estas palavras tão incisivas de Santa Teresa do Menino Jesus e da Santa Face dizem tudo, sintetizam a genialidade da sua espiritualidade e seriam suficientes para justificar o facto de ter sido declarada Doutora da Igreja. Só a confiança e «nada mais»… Não há outra via que devamos percorrer para ser conduzidos ao Amor que tudo dá. Com a confiança, a fonte da graça transborda na nossa vida, o Evangelho faz-se carne em nós e transforma-nos em canais de misericórdia para os irmãos. (Papa Francisco. C’est la confiance, 2)
A frase escolhida pelo papa Francisco resume a doutrina de Teresa que é totalmente baseada no Abandono filial, na confiança plena em Deus, porque “só a confiança nos conduz ao Amor”. O santo padre nos recorda que Teresa é amada e respeitada por pessoas até mesmo fora do âmbito eclesial, sendo homenageada até mesmo pela UNESCO nesse biênio comemorativo entre as personalidades mais significativas para a humanidade, que demonstra a tamanha a força e carisma da jovem carmelita.
No inicio da exortação apostólica o papa recorda a relação dos pontífices com a santa que expressaram especial carinho desde a sua morte até os dias atuais. Destacamos Pio X que colocou Teresa como “a maior Santa dos tempos modernos”, também Pio XI que beatificou e canonizou Teresa chamando-a de “estrela do seu pontificado”. Nos nossos tempos Bento XVI retomou os ensinamentos de Teresa em diversos de seus escritos e Papa Francisco que sempre manifestou uma grande admiração pela santa e que em 2015 canonizou seus pais os Santos Luiz e Zélia Martin.
O primeiro ponto da exortação apostólica é intitulado: “Levar Jesus aos outros”. O papa inicia a exortação ressaltando o objetivo de toda vida de Teresa que foi justamente levar Jesus aos outros, uma experiência de anúncio do Evangelho, por esse motivo foi proclamada Padroeira das Missões, afinal, não existe sinal missionário maior do que esse. Apesar de nunca ter saído do mosteiro nutria grande afeição pelos missionários e pela missão eclesial, realizando no seu contexto a prática evangélica de revelar Jesus aos outros por meio do Amor Misericordioso. Ao trazer a explicação do nome religioso de Teresa o papa sublinha que a profundidade da sua mensagem está justamente no rosto de Cristo que se revela, no Deus que se doa desde a manjedoura até a cruz, o mistério da encarnação e da Morte de Cristo (Menino Jesus e Sagrada Face). O nome revela a missão de Santa Teresa do Menino Jesus que encontra da cruz o sentido da sua vocação.
O Nome de Jesus cadenciou continuamente a «respiração» de Teresa como ato de amor, até ao último respiro. Na sua cela, gravara estas palavras: «Jesus é o meu único amor». Foi a sua interpretação da afirmação culminante do Novo Testamento: «Deus é amor» (1 Jo 4, 8.16). (Papa Francisco. C’est la confiance, 8).
Outro tema escolhido pelo papa foi “o caminho da confiança e do amor” aprofundando alguns pontos do seu caminho espiritual conhecido como “pequena vida”. Ressaltamos que o exemplo do elevador muito conhecido entre os leitores e devotos de Teresa. Na sua época e no seu contexto a teologia era marcada pelos traços do jansenismo, uma corrente teológica que pregava um Deus vingativo e distante das pessoas, também por uma espiritualidade da ascese, onde as pessoas precisavam fazer grandes esforços para chegar até Deus, como uma escada cheia de degraus. Para Teresa era necessário pensar em outra via para chegar ao céu porque reconhecia que para estar perto de Deus bastava a confiança e abandono total e que Ele é quem se abaixava para resgatar os seus filhos. Uma visão muito radical para seu tempo: um Deus que se abaixa? “O elevador que me há de elevar até ao Céu são os vossos braços, ó Jesus! Para isso não tenho necessidade de crescer; pelo contrário, é preciso que eu permaneça pequena, e que me torne cada vez mais pequena” (Ms C, 3vº).
No numero 28 da exortação o papa Francisco recorda a figura de Henrique Pranzini, primeiro filho espiritual de Teresa. A história da santa com o criminoso condenado à morte revela também a misericórdia infinita de Deus. Esses exemplos todos reforçam a direção pela qual o papa quer nos guiar no pensamento de Teresa, aquilo que os estudiosos afirmam ser uma reflexão mais profunda da sua teologia.
“Serei o amor” é outro tema trazido pelo papa Francisco quando fala da autobiografia de Teresa. Para ele o “História de uma alma” é um testemunho de caridade. A vida de Santa Teresa do Menino Jesus é a manifestação de um amor experimentado e compartilhado, uma misericórdia recebida e doada. A sua experiência pessoal com o Amor transborda na relação de Teresa com a sua família, suas irmãs no mosteiro e todos aqueles que se aproximaram ou tiveram contato posteriormente com seus escritos. Essa imitação da caridade perfeita Teresa acolheu da Virgem Maria, modelo principal de vida cristã, por isso, o papa cita a última poesia de Teresa “Porque te amo Maria”. O tema da vivência do evangelho será retomado mais de uma vez na exortação.
A metáfora do Corpo Místico de Cristo também foi abordada pelo papa. “No coração da Igreja – disse Teresa – eu serei o amor”, na diversidade de dons e de carismas formamos um só corpo. Teresa acolheu de modo extraordinário as palavras de São Paulo na carta aos Coríntios e também antecipou o pensamento e a reflexão do Concilio Vaticano II sobre a participação de todo o povo de Deus na missão eclesial como partes de um mesmo corpo.
Depois de aprofundar bastante os principais temas da espiritualidade da Confiança total, o papa recordou a “chuva de rosas” tão importante para os devotos, de fato, não se trata de mero devocionismo, mas, graças recebidas por tantas pessoas pela intercessão de Teresa. O papa Francisco citou as “expressões secundárias”, elementos que foram ressaltados de modo exagerado e que podem abafar aquilo que é a profundidade da espiritualidade dessa grande santa. O papa nos convida a ir além daquilo que sempre escutamos sobre Teresa e adentrar nesse belíssimo caminho espiritual.
No final da exortação o papa diz que Teresa é “mais viva do que nunca” referindo-se à atualidade da sua mensagem. Teresa continua próxima de cada um de seus amigos aqui na Terra e também da missão eclesial de anunciar sempre mais o rosto misericordioso de Cristo. O papa pede para todos nós a chuva de rosas de Teresa como bênçãos do céu.
Frei Juliano Luiz, O.Carm.
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