A catequese mistagógica – tão antiga na Igreja! – encontrou espaço de novo no cenário catequético a partir da constatação de que a catequese precisa ajudar a pessoa a fazer o seu encontro com Deus, a sua experiência de um Deus que é mistério. O processo catequético não tem como finalidade principal ensinar doutrina e gerar conhecimento. Ele precisa ajudar a pessoa a mergulhar no mistério de Deus. Nossos catequistas, na melhor das hipóteses, estavam preparados para ensinar coisas. Mesmo a pregação da Igreja é muito didática, no sentido de ser sempre uma tentativa de ensinar, de falar à razão. Mas a sede do sagrado leva as pessoas a buscar o mistério de Deus, ou o Deus que é mistério. Mistério não se ensina e nem se aprende. Não é uma incógnita cuja resposta é encontrada, nem um enigma a ser decifrado. O mistério não é para ser resolvido, pois ele não é um problema. É para ser contemplado, experimentado, vivenciado.
Mas como ajudar os catequizandos nesse processo mistagógico? Os catequistas logo entenderam que era preciso rezar mais com os catequizandos, apagar as luzes, fazer momentos de silêncio, cantar refrões meditativos – os chamados mantras, que vieram da cultura oriental.
Tudo isso ajuda a experimentar o mistério de Deus. Mas, além disso, pensamos que a mistagogia deve conduzir a catequese a se renovar, não somente criando momentos mais orantes e celebrativos, mas também adotando uma metodologia menos dirigida ao intelecto e mais voltada ao coração das pessoas. É o mesmo que dizer que a catequese deve ser encontro e não aula. As reflexões devem conduzir não exatamente ao aprendizado da doutrina, ou não somente a isto, embora aprender também seja importante, mas à contemplação da beleza do evangelho de Cristo, que nos revela a infinita bondade de Deus. O processo mistagógico leva a vivenciar antes mesmo de compreender tudo. É mais ou menos o que fez Jesus ao lavar os pés dos discípulos. Jesus não ensinou uma doutrina. Ele fez um gesto. Os discípulos vivenciaram, contemplaram. Pedro até se sentiu meio constrangido. E não só Pedro. Todos ficaram meio intrigados. Então, Jesus lhes perguntou: “Compreendeis o que vos fiz?” (Jo 13, 12). E eles disseram que não. Jesus lhes explicou que eles deveriam fazer o mesmo que ele fez. Eles, certamente, contemplando o mistério, guardaram no coração o significado daquela experiência. O gesto de Jesus foi mistagógico, no melhor sentido.
Como fazer uma catequese narrativa?
Outra tendência recente é a da catequese narrativa. Alguém andou dizendo por esse Brasil que a catequese precisa ser mais narrativa. Esse é um conceito mais difícil de entender. Tem a ver com a hermenêutica das Sagradas Escrituras. A ideia básica é que a Bíblia é a narração da experiência do povo de Deus. A catequese será mais narrativa se for uma atualização da Palavra de Deus, que outrora iluminou a vida de outros povos e hoje deve iluminar a nossa vida. Para que isso aconteça, o mesmo evangelho de outrora precisa ser narrado hoje, transmitido hoje, de modo a nos interpelar, ou seja, de modo a provocar em nós uma reação de adesão à boa nova anunciada. O evangelho de Cristo não é algo distante de nossa realidade. Mas, dependendo da forma como for apresentado, pode parecer coisa distante, que não muda em nada a nossa vida. A narratividade da catequese está na forma envolvente de se apresentar a boa-nova.
Isso nem sempre foi bem entendido. Alguns acharam que fazer catequese narrativa é contar histórias: a história do povo de Deus, a história de Jesus, a história da salvação. Então, em vez de apresentarem um conteúdo orgânico e sistemático, limitaram a catequese à contação de histórias. Contar histórias é bom também, mas a catequese não deve se limitar a isso.
Alguns entenderam a catequese narrativa como algo bem espontâneo, que desse ao catequizando a oportunidade de narrar o que pensa, de se expressar, de narrar suas experiências, de dizer o que sente, por exemplo, diante de uma gravura ou de um recorte de jornal. Estaria assim o catequizando narrando suas impressões. Isso também pode ser válido, mas não garante a narratividade da catequese.
E mais, essas iniciativas não garantem que a catequese tenha ficado de fato mais envolvente, menos doutrinal, menos escolástica – e esse é o objetivo da catequese narrativa.
Vamos, então, frisar: catequese narrativa é apresentar a boa-nova de Cristo de modo que o Evangelho seja uma força que nos interpela, que muda a vida da gente, que provoca uma interação entre o catequizando e o mistério revelado.
O Evangelho não pode ser apresentado como um conjunto de verdades frias e distantes, porque ele não é isso. Quando Jesus pregou ao povo, seu Evangelho foi acolhido com motivação. As pessoas interagiram com Jesus. O desafio é continuar pregando o mesmo Cristo e provocando nas pessoas essa mesma interação com ele. Com isso, os catequizandos se tornam seguidores de Cristo. A Igreja precisa narrar o evento Cristo de modo a envolver as pessoas de cada tempo, porque Deus continua interpelando as pessoas hoje.
Foi o que os evangelistas fizeram. Eles narraram o evento Cristo de modo a interpelar as pessoas do seu tempo. Fizeram uma releitura do Antigo Testamento, atualizando a mensagem a partir de Cristo, centro da revelação. O desafio hoje é transmitir a fé de forma tal que a pessoa se deixe iluminar por essa experiência cristã, de modo que a mesma Palavra de Deus faça sentido na vida da pessoa. Isso é catequese narrativa.
* Doutoranda em Catequese pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia-FAJE (15.08.2012)
Comments0