A indiferença é incontestável ameaça à paz e, por isso, o Papa Francisco faz o convite-convocação: “Vence a indiferença e conquista a paz”. Essa interpelação, tema do Dia Mundial da Paz 2016, diz respeito a todos os cidadãos. Exige redobrada atenção por parte dos diferentes segmentos da sociedade. Não se trata de um movimento simples e qualquer, mas da capacidade para o diálogo, que vai além de simples conversa e está distante dos conchavos interesseiros. Trata-se de caminho para nova cultura.
A indiferença é espessa camada a ser removida, com muito esforço, para dar lugar à fluidez da escuta e sensibilidade que fazem nascer no coração humano a competência para eleger, em todas as circunstâncias, o outro como prioridade. Por isso, se equivocam dirigentes, governantes e todos os que escolhem, decidem e operam na contramão do diálogo. Os prejuízos são enormes e facilmente constatáveis: a vergonhosa exclusão social, a perpetuação dos esquemas de corrupção e a manipulação do que é bem comum em benefício de interesses particulares. O resultado é uma terrível mediocridade na atuação de dirigentes e governos, sem lucidez para encontrar soluções e saídas. Consequentemente, a paz segue ameaçada.
É óbvio concluir que a falta de diálogo provocada pela indiferença é um problema grave. Trata-se de carência comum a vários ambientes – parlamentos, muitas vezes cenários de poucos e ineficazes entendimentos; diversos ambientes de trabalho e famílias. A falta do diálogo, alimentada e alimentadora da indiferença, tudo envenena. A indiferença comprova a carência de sabedoria na condução da vida. É sinal da perda de rumo e da incompetência que impede exercícios responsáveis e inventivos na atuação profissional e cidadã.
Situações desoladoras resultam desse verdadeiro veneno: os desperdícios, a perda de oportunidades para avanços e progressos, o recrudescimento de grupos, a disputa entre pessoas, famílias, nações. Ninguém fica isento de pagar um alto preço, que inclui o aumento da violência. Ela nasce também das revoltas e da dor da indiferença sofrida pelos mais pobres, por quem não tem voz e vez. E não adiantam esquemas de segurança, isolamentos que desenham segregações, ou portas fechadas para tratar em mesas restritas os assuntos que dizem respeito ao interesse do bem comum.
Nesse contexto, a vida de todos, indistintamente, é temperada pelos espectros de incertezas e desconfianças que descompassam corações, inteligências e vivências. Não há, assim, outro caminho, senão acolher, efetiva e urgentemente, a convocação de investir na superação da indiferença, particularmente pela prática sincera e permanente do diálogo, compreendido como escuta prioritária do outro, antes de qualquer juízo e decisão. Isso envolve a conduta pessoal e também transformações nas dinâmicas institucionais. É mudança cultural capaz de introduzir uma novidade na esfera de entendimentos e de deixar aparecer a luz da sabedoria, que permite encontrar saídas para as crises. Uma luminosidade apropriada para oferecer respostas aos muitos questionamentos, soluções para problemas e dar nova configuração aos cenários sociais, políticos e culturais.
Vale acolher a instigante convocação feita pelo Papa Francisco, “Vence a indiferença e conquista a paz”, que se torna ainda mais forte pela exemplaridade de suas atitudes – em permanente diálogo com todas as pessoas, com a cultura contemporânea – e também por sua simplicidade cativante. Acolher essa convocação significa admitir que a indiferença globalizada é um inimigo comum a ser combatido e vencido com urgência. Esse embate inclui indispensavelmente o empenho pessoal de todos. Raciocínio lógico e simples é considerar que se cada pessoa enfrenta a indiferença e luta pela paz, alcança-se grande impacto positivo na qualidade dos relacionamentos e valiosas soluções para as crises governamentais, institucionais, familiares e de relações humanas.
Há um caminho a ser trilhado para qualificar-se como agente de combate à indiferença na sociedade: buscar aproximar-se de Deus. O Papa Francisco lembra que a indiferença em relação a Deus supera a esfera íntima e espiritual do indivíduo e traz consequências para a esfera pública e social. De modo interpelante, Francisco acrescenta que o esquecimento e a negação de Deus induzem o homem a não reconhecer qualquer norma que esteja acima de si. Isso produz crueldade e violência. Assim, para edificar um mundo melhor, é hora de vencer a indiferença que ameaça a paz.
Por Dom Walmor Oliveira de Azevedo – Arcebispo de Belo Horizonte
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