“Investigai as Escrituras…: são elas que dão testemunho a meu favor” (5,39).
Forma, características e data
O Evangelho de João é bastante original. Não é composto de breves histórias, como os outros evangelhos, mas de grandes episódios, em que se misturam narrativa, diálogo e discurso, assumindo muitas vezes forma de teatro. Relata o que aconteceu desde os dias de João Batista até o dia em que o Senhor Jesus passou para a glória do Pai (At 1,21-22). Menciona diversas viagens de Jesus a Jerusalém e três páscoas, enquanto os outros evangelhos só mencionam uma. Concentra-se na pessoa de Jesus. Foi o último evangelho a ser publicado, entre os anos 90 e 100, provavelmente na cidade de Éfeso.
Autor
É atribuído a João, filho de Zebedeu, um dos doze apóstolos de Jesus. O autor se considera uma testemunha de Jesus Cristo (19,35; 21,24). Muitos biblistas consideram esse evangelho como obra de um discípulo ou de uma comunidade discípula de João, uma geração mais tarde, daí a primeira pessoa do plural “nós”, que por vezes aparece (3,11; 21,24).
Destinatários
Destina-se aos cristãos, na sua maioria vindos do paganismo e do judaísmo, dentre os quais boa parte tinha dificuldades em entender a condição divina de Jesus e era exageradamente apegada às instituições religiosas judaicas que se apresentam como superadas (2,19-22). Objetiva também orientar e confirmar na fé os cristãos influenciados pelos gnósticos docetas, que negavam ter Jesus vindo ao mundo em carne mortal. Para estes João sublinha o realismo da humanidade de Jesus (1,14; 6,53s; 19,34), apela à unidade (10,16; 11,52; 17,21-24) e ao amor fraterno entre todos os fiéis (13,15.31-35; 15,12-13).
Finalidade e conteúdo
Fortalecer os fiéis na fé que confessa Jesus como Messias e Filho de Deus, dois pontos bastante atacados pelos judeus (enquanto conotação religiosa, sem conotação de raça). Mais que doutrina, oferece matéria de contemplação. Sua realidade é simbólica, carregada de um excesso de sentido que a fé descobre e a contemplação assimila. João escolheu alguns símbolos dos quais ele traz à luz o significado e o alcance, a fim de levar os cristãos a quem se dirige a melhor aprofundarem a sua fé em Jesus Messias e Filho de Deus: Luz (8,12; 9,5); Ressurreição e Vida (11,25); Caminho, Verdade e Vida (14,6); Pastor (10,11) Porta (10,7.9), Pão da Vida (6,35); Pão vivo (6,51); Ele traz em si o dom da Água da Vida (4,14; 7,37s). João pretende dar-nos a chave da compreensão do mistério da pessoa e da obra salvadora de Jesus, sobretudo através das Escrituras: “Investigai as Escrituras…: são elas que dão testemunho a meu favor” (5,39).
Milagres são chamados de sinais
Os milagres são chamados de “sinais”, porque revelam a identidade de Jesus, a sua glória, o seu ser divino e o seu poder salvador. Também porque se trata de fatos significativos e não de meros acontecimentos históricos, os quais têm como objetivo a fé na pessoa e na obra salvadora de Jesus. O seu valor não está na materialidade dos fatos, mas no que significam. O vinho lembra a bebida das núpcias messiânicas; a saúde remete para a vida que Jesus traz; o pão lembra seu ensinamento e dom da própria vida; a restauração da vista ensina que Jesus é a verdadeira luz; o reerguimento de Lázaro aponta para a “Ressurreição e Vida” presentes em Jesus. Quem não vê o sinal no gesto de Jesus é como se não tivesse visto nada (6,26).
A “hora” de Jesus
Em várias passagens do evangelho Jesus fala da sua “hora” (2,4; 4,21.23; 5,25.28; 7,30; 8,20; 12,23.27; 13,21; 16,2.4.21.25.32; 17,1). “Hora” no evangelho de João é a expressão que designa o momento em que Ele é, ao mesmo tempo, elevado na cruz e na glória, pois em seu morrer transparece a glória do Pai, que é amor e fidelidade até o fim. Por isso que nas Bodas de Caná, quando falta vinho, Jesus responde a Maria “A minha hora ainda não chegou” (Jo 2,4).
Divisão do conteúdo
I. PRÓLOGO (1,1-18): Uma solene abertura que anuncia as ideias mestras.
II. PRIMEIRA PARTE (1,19 – 12,50): Manifestação de Jesus ao mundo como Messias, Filho de Deus.
1) Primeiro ciclo da manifestação de Jesus (1,19 – 4,54).
2) Jesus revela a sua divindade (5). Ele é o Filho igual ao Pai.
3) Jesus é o “Pão da Vida” (6).
4) Jesus é a “Luz do mundo” (7,1 – 10,42).
5) Jesus é “a vida” do mundo (11).
III. SEGUNDA PARTE (13,1 – 21,25).
1) A Última Ceia (13,1 – 17,26).
2) A Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus (18, 1 – 20,29).
IV. EPÍLOGO (20,30 -21,1-25): Dupla conclusão. Aparição na Galiléia.
Comments0