Em que medida os cinco sentidos (visão, audição, paladar, olfato e tato) são envolvidos nas formas celebrativas da fé? Quais sentidos do corpo são, de fato, privilegiados na liturgia dos sacramentos e, de modo particular, na celebração eucarística? É verdade que nas celebrações litúrgicas do Ocidente prevaleceu o verbalismo e o intelectualismo em detrimento da corporeidade?
Essa série de interrogações deixa clara a necessidade de interpretação dos fenômenos que podem ser observados, com acentos variados, nas celebrações em nossas paróquias. Uma maior participação, às vezes mais perceptível em alguns momentos do ano litúrgico, pode encontrar uma motivação a mais também num maior envolvimento do corpo na celebração. A procura pelo ramo bento (domingo de Ramos) e a cinza na cabeça (início da Quaresma) pedem uma expressão mais concreta da fé e um empenho de conversão.
A valorização do corpo pode ser encontrada no hábito de levar flores a Nossa Senhora ou a um santo de devoção; no gesto de acender uma vela em pagamento a uma promessa; no tocar ou beijar uma imagem; na busca pelo pão de santo Antônio ou de uma gota de água benta durante uma bênção; na devoção a um santo popular (são Judas, santo Expedito, santo Antônio, santa Edviges etc.).
Embora não seja a motivação principal, também a necessidade de dar atenção a verdadeiros ou pretensos milagres ou aparições pode estar ligada à exaltação da sensibilidade corpórea, mediação indispensável da vida de fé. Descartando a solução fácil, mas superficial, de justificar a maior participação corpórea como efeito das exigências da piedade popular, deve-se ver o complexo fenômeno do corpo na liturgia além da perspectiva da comunicação: o corpo é, antes de tudo, um conjunto de canais receptores.
Os estudos da fisiologia aperfeiçoaram o conhecimento do corpo, considerado como um conjunto de células sensitivas especializadas na percepção da luz, do som, do sabor, do contato, do odor e coligadas com uma complexa rede de nervos que continuamente transmitem dados à atividade cerebral, que por sua vez funciona como um centro de elaboração das informações recebidas. Toda pessoa, no momento de seu nascimento, salvo os casos de deficiência, encontra-se dotada dos cinco sentidos como instrumento de ligação com seu interior e com tudo que está fora de si. Essas potencialidades iniciais, iguais para todos, condicionadas, desde os primeiros momentos da existência, pelo ambiente e pela educação, terão um desenvolvimento diversificado.
A antropologia atual desmistifica toda tentativa que leve a acreditar em uma universalidade da percepção sensorial e alerta contra o desejo de uma única cultura hegemônica de fazer do próprio modelo cultural perceptivo a única possibilidade para os sentidos. A diversidade não pode ser atribuída somente ao suposto grau de civilidade “primitiva” ou “moderna”: as experiências de ver, ouvir, cheirar, saborear e tocar assumem diversos significados de cultura para cultura também hoje.
O uso dos sentidos na liturgia é submetido a uma escolha preliminar: deve-se valorizar a educação perceptiva em ato em determinada cultura ou a liturgia tem uma autonomia perceptiva que vai além de todas as culturas e é, portanto, transplantável sem nenhum problema? Se, de fato, a celebração litúrgica quisesse uma utilização “completamente diferente” dos sentidos, deveria ter uma educação paralela, com o risco de sair da história concreta para terminar em conflitos irredutíveis ou na não comunicação. Por outro lado, a valorização da percepção já adquirida, mesmo se submetida à adequação e às potencialidades, permite um processo de inculturação que leva em conta a globalidade da pessoa que comunica na liturgia.
Toda reflexão sobre a valorização dos sentidos do corpo na liturgia pede a vinculação do específico religioso à socialização corpórea já formada.
Detendo-nos em nossa experiência cultural, podemos constatar que o fiel traz consigo uma educação perceptiva com algumas acentuações. A hierarquia que parece estar instalada, também por meio das tecnologias da comunicação, enumera em ordem decrescente: visão, audição, tato, paladar e olfato. A cultura leva a privilegiar a junção audiovisual, mais coligada à imagem que à língua, mais para um envolvimento dinâmico do que para uma segurança estática.
Dispondo do uso dos sentidos na celebração eucarística, o fiel sabe antecipadamente, pelo conhecimento das regras do rito, qual dos sentidos será mais solicitado e de que forma: escutará os textos da Sagrada Escritura, a homilia, as orações, os cantos, a música; verá uma arquitetura conhecida, uma decoração, uma disposição dos objetos e das pessoas no espaço celebrativo; saboreará o pão e o vinho consagrados; apertará a mão do vizinho no momento da paz; sentirá o perfume do incenso, das velas, das flores. As expectativas presentes no fiel estão centradas mais na segurança de um papel a ser repetido, mesmo com as devidas originalidades, do que numa ação a ser inventada: a porcentagem de expectativa do novo por meio do uso de seus sentidos é baixa em relação ao uso habitual.
A situação inicial de comunicação protegida do imprevisto, com o passar do tempo, pode degenerar em simples “repetição de um rito”, que tranquiliza, mas com dificuldade torna-se oração.
A diversidade de uso dos sentidos na celebração eucarística não deve ser considerada somente em relação a uma educação anterior na cultura local, mas também em relação ao significado que o sensível assume na fé celebrada: “Os sentidos mais acurados não podem, sozinhos, captar o valor da água benta”. Se é verdade que a palavra deve conduzir a um significado litúrgico, contudo não é improvável que exista um desvio progressivo rumo a um logocentrismo onipresente. A dimensão de sinal e símbolo dos quais se nutre a celebração litúrgica, quando ligada às possibilidades perceptivas do corpo, encontra material para a reflexão sobre o empobrecimento dos sinais, sobre a construção sofisticada dos símbolos, e, dessa forma, propõe novamente a necessidade de desvelar também os próprios postulados sobre o corpo. A comunicação na liturgia não pode fundar-se nem sobre a corporeidade apenas nem sobre a negação do corpo.
Fonte: Revista Vida Pastoral
Comments0