A Solenidade da Anunciação é uma festa do Senhor, pois celebramos o anúncio de seu nascimento. Porém, é muito comum pensar que é uma festa mariana, haja vista que Maria está intimamente ligada a ela, pois o anúncio é feito à Virgem. É a proclamação de um novo tempo, é a inauguração de uma nova criação, é o cumprimento das promessas de Deus quanto à salvação da humanidade. É mais um mistério ao qual inclinamos nossa razão e damos espaço à fé no poder de Deus.
Essa solenidade inaugura o acontecimento em que o Filho de Deus se faz carne para consumar seu sacrifício redentor em obediência ao Pai. Assim, ao entrar no mundo, Jesus diz: “Não quiseste sacrifício nem oblação, mas me formaste um corpo. Holocaustos e sacrifícios pelo pecado não te agradam. Então, eu disse: ‘Eis que venho, venho ó Deus, para fazer a tua vontade’” (Hb 10,5-10). Assim, aboliu o antigo regime e estabeleceu uma nova economia. Foi em virtude dessa vontade de Deus que temos sido santificados uma vez para sempre, pela oblação do corpo de Jesus Cristo.
Jesus, concebido no seio materno da Virgem Maria, teve um corpo igual ao nosso, exceto no pecado. Deus, em seu amor infinito, desejou salvar a humanidade por meio dela mesma, ou seja, somente um verdadeiro homem poderia assumir o lugar de toda a humanidade. Um anjo, por exemplo, não poderia assumir esse papel, pois pertence a outra espécie, ou melhor, cada anjo é uma espécie única, muito diferente do ser humano, que na sua totalidade pertence a uma mesma espécie.
Assim, Jesus, verdadeiro Deus, agiu livremente assumindo um corpo no seio bem-aventurado de Maria, sem participação de homem, mas pelo poder do Espírito Santo. É uma ação da Santíssima Trindade, pois Deus envia seu Filho único, que é gerado pelo poder do Espírito Santo. É um ato livre e soberano de Deus, uno e trino. Deus, desejando que seu Filho único se fizesse homem, no seio da Virgem Maria, deu-nos a possibilidade de participar da divindade do nosso Redentor, que proclamamos verdadeiro Deus e verdadeiro homem.
Mas, quanto a Maria, o que podemos falar?
Ela se associa à obediência do Cristo, vivendo sacramentalmente na fé o sentido pascal da anunciação. Maria é a filha de Sião que, coroando a longa espera, acolhe com seu “sim” e concebe por obra do Espírito Santo o Salvador. Nela, virgem e mãe, o povo da promessa se torna o novo Israel, Igreja de Cristo (cf. Missal romano, p. 564).
“A Virgem Maria recebeu com fé o anúncio do anjo; e, à sombra do Espírito Santo, acolheu com amor, no seio puríssimo, aquele que, para salvar os seres humanos, quis nascer entre eles. Assim, cumpriram-se as promessas feitas a Israel e, de modo inefável, realizava-se a esperança das nações.” (Prefácio da Missa da Anunciação, Missal romano, pp. 565-566)
A plena liberdade de Maria a conduz à realização plena da vontade de Deus.
Não há obstáculos que a impeçam de se associar ao plano de salvação que Deus lhe propõe. Ela foi preparada desde o seu nascimento, pois é imaculada, ou seja, nasceu sem mancha, pelos méritos de Cristo. Maria é verdadeiramente livre, por isso deu seu “sim” incondicional. Maria, pelos méritos de Cristo, participou da nova criação que busca a plena comunhão com seu Criador. A desobediência não tem espaço em sua vida. Obedecer não é um peso, mas satisfação, por isso Maria, reconhecendo as maravilhas do Senhor em sua vida, proclamou: “Minha alma glorifica ao Senhor, meu espírito exulta de alegria em Deus, meu salvador, porque olhou para sua pobre serva” (Lc 1,46-48).
Maria é saudada pelo anjo Gabriel como “cheia de graça”. Ela é plena da graça de Deus. Essa plenitude da graça acolhida e vivida permite que a vontade de Maria esteja plenamente de acordo com o plano de salvação, ou seja, ela está disposta a fazer a vontade de Deus: “Faça-se em mim segundo a sua vontade” (Lc 1,38). Ela não se esvaziou de sua vontade, mas se associou plenamente à de Deus. Maria não deseja fazer outra coisa que a vontade de Deus. Ela consagrou sua vida a Ele. Não há outra coisa para fazer a não ser seguir os passos do Senhor. Maria não sabia exatamente o que aconteceria, mas foi guardando em seu coração todos os sinais, todas as palavras e gestos de seu Filho, desde a mais tenra idade até sua morte na cruz.
O anúncio da vinda do Senhor a Maria é um anúncio a toda a humanidade. O Salvador se fez homem para nos resgatar plenamente, isso é possível porque Ele é Deus desde todo o sempre. Maria acolhe o Salvador e permite que seu corpo seja formado em seu casto ventre. Jesus, verdadeiro Deus, sendo gerado no seio maternal de Maria, torna-se verdadeiro homem. O projeto de Deus é a restauração da humanidade, somente um homem perfeito poderia quebrar a maldição que havia recaído sobre a raça humana. Pela obediência de Jesus Cristo a desobediência de Adão é vencida.
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