Escolher os padrinhos de uma criança é uma grande responsabilidade, tarefa importante que deve ser feita com muita atenção. Muito mais que uma posição social, os padrinhos são considerados pais espirituais de seu(ua) afilhado(a). São aqueles que recebem a incumbência de ajudar na criação e educação dos batizandos, dar conselhos, além de ser exemplos de cristãos, acompanhando-os em todos os momentos da vida.
Em algumas histórias é comum que, na ausência ou morte dos pais biológicos, o padrinho ou a madrinha assumam o papel de pai ou mãe de seu(ua) afilhado(a).
Aceitar esse apadrinhamento é criar um importante elo de amor e compromisso para a eternidade. É pelo Sacramento do Batismo que os padrinhos se comprometem perante a Deus e se colocam à disposição para ajudar os pais na missão de educar os filhos na fé cristã, na vivência em comunidade como discípulos de Jesus Cristo, observando sempre os mandamentos.
Desde os tempos mais antigos, o Batismo é administrado às crianças, pois é uma graça e um dom de Deus que não supõe méritos humanos; as crianças são batizadas na fé da Igreja.
Tradicionalmente, os padrinhos já apareciam no século IV da era cristã: “Na ocasião, a Igreja de Cristo sofria muitas perseguições romanas e ainda passava por um tenebroso período de heresia; uma delas, chamada pelagianismo, que negava a necessidade de que as crianças fossem batizadas. No ano 418, com o Concílio de Cartago, em resposta ao pelagianismo, a Igreja condenou a heresia e rejeitou o ensinamento daqueles que negavam o Batismo das crianças” (Márcio Jean Fialho de Sousa, Quer ser meu padrinho? Quer ser minha Madrinha? – Padrinhos, pais pelo sacramento, Editora Ave-Maria, 2018).
Nesse contexto, aos padrinhos cabia o dever de auxiliar os pais na instrução da fé cristã católica e de professar a fé em nome do batizando.
“Os padrinhos e madrinhas, como parte da comunidade cristã, também assumem a mesma responsabilidade, porém, seu papel assume caráter formal, público e sacramentalmente diante da Igreja. Mas seu compromisso está sempre aliado aos dos pais, que também se comprometem com a formação cristã daquela criança”, comenta Márcio Jean Fialho de Sousa em entrevista para a reportagem da Revista Ave Maria.
Inclusive, já no início do rito do Batismo o celebrante dirige algumas perguntas aos pais, se eles querem ajudar suas crianças a crescer na fé, observar os mandamentos e viver na comunidade dos seguidores de Jesus. Em, seguida direciona o questionamento aos padrinhos, se estão dispostos a colaborar com os pais nesta missão.
A missão número um dos padrinhos é de ser educadores na fé. Para isso acontecer é preciso que eles tenham condições morais e espirituais para ajudar seus afilhados quando necessário.
Especialista em Teologia e atuante na Pastoral do Batismo há mais de vinte anos, Márcio Jean fala sobre os principais requisitos que devem ter aqueles que podem ser padrinhos ou madrinhas: “O próprio Catecismo da Igreja Católica, no parágrafo 1255, apresenta algumas orientações: ‘Eles precisam ser cristãos firmes, capazes e prontos a ajudar o novo batizado, criança ou adulto, na sua caminhada na vida cristã’. Além disso, recomenda-se que tenha, no mínimo, 16 anos e tenha recebido os sacramentos da iniciação cristã: Batismo, Eucaristia e Crisma. Enfim, os candidatos a padrinhos e madrinhas precisam ser católicos de fato”, comenta Sousa.
Para tão agraciada missão não deve ser apenas um parente ou um amigo especial, mas alguém que crie uma relação espiritual com o batizando e esteja presente no cotidiano.
Os padrinhos devem rezar sempre pelos afilhados, dar-lhes testemunho de uma fé cristã autêntica, ser para os afilhados um sinal profético de Cristo, de modo que, pelo exemplo e por sua oração, eles possam alcançar as virtudes necessárias para serem também bons cristãos.
Um dos principais desafios da Pastoral do Batismo é e conscientizar pais e padrinhos para a importância desse Sacramento, o fundamento de toda vida cristã; constitui o nascimento para a vida nova em Cristo. Ao recebermos o Batismo, transformamo-nos de criaturas para filhos amados de Deus.
Nelson da Silva, 62 anos, é diácono permanente há um ano e atua há mais de 22 anos na Pastoral do Batismo da Paróquia Nossa Senhora do Retiro, em Pirituba, zona oeste de São Paulo (SP). Em entrevista, falou sobre essa vivência: “Nosso papel é transmitir aos pais e padrinhos uma consciência desse importante Sacramento, porta de entrada para religião cristã católica. Que recebam as informações de uma maneira satisfatória e de uma forma comprometida assumam a missão de serem os primeiros a transmitir e dar testemunho de uma fé verdadeira aos filhos e afilhados”, comenta.
Segundo o diácono, há também o desafio de “Apresentar a graça, o amor de Deus que se descortina igualmente em todos os outros sacramentos, incluindo o Matrimônio”. Ele recorda que numa dessas preparações para o Batismo, ao falar sobre como regulamentar uma situação matrimonial, um casal de padrinhos que viviam em união estável demonstrou interesse na possibilidade de assumirem a vida matrimonial também como um estado de graça sacramental: “Para a minha surpresa, nessa semana interessei-me por um proclama no mural da Igreja ao verificar os nomes dos noivos; constatei que era aquele casal que se sentiu tocado numa das nossas preparações para o Batismo. Esses acontecimentos nos incentivam a continuar na missão e conseguimos enxergar o dedo de Deus nos mostrando o caminho da alegria em servir”, discorre Silva.
É sempre esperado que os padrinhos sejam apoios para os pais de seus afilhados em caso de quaisquer dificuldades. Muito além de dar presentes é mais precioso que aconteça uma amizade e haja uma grande cumplicidade entre as partes nesse apadrinhamento.
Assim aconteceu com Rosa Reis, 58 anos, atual coordenadora da Comunidade Eclesial de Base Santo Oscar Romero e Santa Luzia, do Parque Santa Madalena, zona leste de São Paulo. Há mais de trinta anos ela acolheu em sua casa a jovem Matilde de Oliveira, na época com 17 anos. Elas se conheceram numa festa de casamento e dias depois Rosa recebeu a notícia de que a garota havia sido atropelada.
“Logo que eu soube fui visitá-la, aproximei-me bastante dela e de sua mãe e me coloquei à disposição para ajudar no que fosse preciso”, recorda a futura madrinha. Dias depois veio o convite e o apelo para que ficasse com a menina, pois a mãe não tinha condições financeiras de custear o tratamento médico. Rosa e seu esposo, Jair, que já eram pais de dois filhos, prontamente acolheram a afilhada, ajudaram na restauração da sua saúde e a batizaram na Igreja Católica.
“De afilhada ela virou minha filha. Quando era preciso chamar a atenção e repreender eu fazia, assim como eu agia com meus outros filhos. Ela sempre foi muito amável e prestativa, fazia o papel de irmã mais velha, ajudando em tudo. Só saiu da minha casa quando foi se casar”, recorda Rosa.
Os filhos de Matilde chamam Rosa de avó e os netos já a reconhecem como a “bisa”. Uma relação de amor e gratidão mútua: “Tê-la como filha é uma grande alegria, se fosse hoje faria tudo igual novamente, principalmente pela mulher que ela se tornou. Tenho muito orgulho”.
Para Matilde, ter sido apadrinhada e acolhida pelo casal Reis fez toda a diferença em sua história. “Até hoje, aos 50 anos, conto com os meus padrinhos para tudo. Adotei-os como pai e mãe, um amor incondicional, eles são meu porto seguro e sou muito grata por tudo que fazem e fizeram por mim”, encerra a afilhada.
Um acidente de carro há 36 anos tirou a vida do casal Inocêncio e Doralice, de seu filho Raphael, de apenas 10 meses, e de mais um bebê ainda no ventre, deixando órfã a pequena Alessandra Natrielli Carvajal Jimenez de Proença Flora, na época com 5 anos. Uma das piores experiências de sua vida, relata a empresária que hoje tem 42 anos.
Alessandra já havia sido batizada pelo casal Ademir e Sônia, que era irmã de Dora. Logo nos primeiros dias após a morte dos pais, a menina foi acolhida pelos avós maternos e por seus padrinhos. “No dia do acidente eu me lembro que pedi ao meu pai para não viajarem, que iria acontecer algo ruim, mas ele não me ouviu. Quem acreditaria na fala de uma criança?”, recorda triste.
Não bastasse todo o sofrimento pela perda repentina de três entes queridos, seus padrinhos tiveram que lutar na justiça durante dois anos para ter direito de ter a guarda da criança, que era disputada pelos tios paternos. Desde então foram muitas batalhas e desafios.
“Eu me casei, tive duas filhas maravilhosas e quando menos esperávamos recebi o diagnóstico de câncer de mama aos 30 anos! Uma semana depois, veio a notícia de que eu estava grávida do meu terceiro filho. Infelizmente, o coraçãozinho do meu nenê parou de bater, mas graças a esse meu anjo abençoado foi possível descobrir o tumor no meu seio”, recorda. Não bastasse isso foi descoberto um novo câncer de pele e Alessandra teve que passar por cirurgias e um difícil tratamento. “Todo esse tempo meus padrinhos estiveram ao meu lado, ajudaram-me em tudo, cuidando de mim com amor e carinho”, relata.
Após a cura do câncer, Alessandra se separou do primeiro marido e, por ter casado muito jovem, após o divórcio passou a ter comportamentos levianos, deixando as filhas e a família de lado. Mais uma vez, seus padrinhos deram todo o suporte emocional, ajudando-a a reencontrar seu caminho.
A empresária se casou novamente e está superfeliz com seu novo marido, Rudson, e junto das filhas e de sua família, sem jamais se esquecer de tudo que seus padrinhos Ademir e Sônia fizeram e fazem por ela: “O que teria sido da minha vida sem eles? Todos os valores impagáveis foram deles que eu recebi. Sou grata e devo tudo aos dois, que com muita paciência, dedicação e amor me ensinaram. Foi ao lado dos meus padrinhos que aprendi o verdadeiro significado das palavras ‘família’ e ‘amor’. Eles são meus alicerces, meu orgulho, minha maior admiração!”, finaliza.
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