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“Ninguém pode servir a dois senhores, porque ou odiará a um e amará o outro, ou dedicar-se-á a um e desprezará o outro” (Mateus 6, 24)
Fato: Jovens estudantes universitários, diante de algumas notícias publicadas, discutiam a veracidade da fé, a pessoa de Jesus. Opiniões diversas,
favoráveis e contrárias levavam a vários questionamentos. Alguns se sentiam desafiados ao testemunho, outros se manifestavam decepcionados e mesmo revoltados com tudo. Outros ainda se serviam das informações para negar tudo o que diz respeito à fé e à religião.
Os primeiros cristãos tiveram que conviver numa sociedade pagã e incrédula e foi nessa situação que fizeram resplandecer a luz da fé. Nós vivemos em situações semelhantes e temos o mesmo desafio e ousadia a viver.
Naquela época já se falsificava a doutrina e se adulteravam os ensinamentos de Jesus para adaptá-los aos interesses pessoais e grupais, desviando- os da verdade. Hoje, com mais sagacidade se falsificam e deturpam os ensinamentos de Jesus em modos e linguagens bem dissimuladas.
Será que, mesmo nos afirmando ser cristãos, conhecemos a Jesus? Talvez nem saibamos o que responder. Se somos de fato cristãos, como explicar tanto erro, tanta infidelidade? Muitos se dizem cristãos, mas, não pensam como cristãos, não agem como cristãos. Entendem e vivem a fé como lhes convêm, selecionam o que combina com seus interesses e opiniões, com seus gostos e paixões e descartam, alteram ou falsificam tudo o mais.
Querer só receber e nada dar, satisfazer suas necessidades e não pensar nas dos outros, querer reduzir Deus à sua visão e interpretação é um desvio que descaracteriza a novidade, a beleza, a verdade, a vida, a fé. A fé adulterada dos que pretendem livrar-se de perseguições, calúnias, martírios, desejando ao mesmo tempo viver unidos a Cristo, não é possível.
Pedro se dirige aos “que deixaram, abandonaram, desprezaram toda malícia, todo fingimento” (1Pe 2,1), isto é, aos que parecem ser o que não são, apenas pegar o que lhes convêm e deixar o que exige conversão, renúncia, o que incomoda enganam a si mesmo e aos outros.
A humanidade, em geral, fala de Cristo com respeito, porque o considera como Deus ou porque o admira como um homem extraordinário. Porém, ao mesmo tempo, essa humanidade ridiculariza e despreza os cristãos que devem ser os seguidores de Jesus. Que mistério é esse?
Se a humanidade visse em cada cristão a expressão viva do amor de Jesus, de sua sabedoria, e tivesse uma vida inspirada na sua Palavra vivida como estilo de vida, enalteceria os que assim vivem e reconheceria quão verdadeira é a fé, quão real é Jesus.
Será que a crise de fé pela qual passa a humanidade, o desprezo pelos valores cristãos, pelo mistério revelado, não se deve às nossas deficiências, à falta de fidelidade, à mistificação que fazemos de seus ensinamentos, as distorções que introduzimos em sua vida?
Muitas vezes sentimos nosso amor-próprio ferido e, desejando justificar-nos a todo custo, vemos como injusto e desrespeitoso o que se diz e se faz com nossa fé, reduzida muitas vezes a desprezo, escárnio, zombaria. Mas, nisso tudo também não somos responsáveis por essas críticas e reivindicações? Pensemos sobre o assunto. A crítica e a condenação das pessoas que consideramos injustas podem ser um juízo merecido pelo nosso modo falso de ser cristãos.
Não duvidemos: a fé vivida e praticada com coragem brilha e atrai com força irresistível. Ninguém fica indiferente diante de uma expressão autêntica da fé que conduz ao amor. Porém, se queremos parecer cristãos, mas sendo pagãos de fato em nossos pensamentos, sentimentos e comportamentos, merecemos ser questionados e desafiados e ser autênticos.
O que atrai, edifica, arrasta é a vida autêntica e quem não a vive não convence nem a si, nem aos outros. Diante dessas situações desafiadoras somos questionados permanentemente e somos responsáveis pela imagem de Deus que expressamos, que pode ser adulterada pela nossa incoerência. Viver a fé é uma experiência de abertura, descoberta, acolhida, aceitação, vivência, testemunho. É essa experiência que pode despertar em nós o desejo permanente de “converter e crer no Evangelho”.
Os príncipes e os fariseus reuniram o concílio (Jo 11, 47). Eles se reúnem para tomar uma decisão iníqua. Tramam contra Jesus porque Ele fala a verdade e isso os incomoda, condena os erros e reprova a falsidade na qual os fariseus se identificam. Das suas más paixões e de todas as manifestações da inveja que os pervadem surge o decreto da morte daquele que é a Vida.
Os discípulos viveram essa mesma condição do Mestre. Os que seguiram a Cristo praticaram seus ensinamentos, percorreram o mesmo caminho e chegaram ao Calvário. Morreram como testemunhas da fé.
Podemos explicar nossa vida tão cheia de misérias e sofrimentos devido à nossa vivência tão pouco comprometida, nossa sensibilidade adormecida, dureza de nosso coração que teima em fechar-se à verdade, ao amor, e à nossa maneira distorcida de viver a fé. E podemos experimentar o sofrimento exatamente por sermos fiéis a Jesus.
Quem renega sua fé é um apóstata, um traidor que manifesta o contrário do que diz crer. Não sejamos daqueles a quem o profeta Elias diz: “Até quando andareis mancando dos dois pés? Se o Senhor é Deus, segui-o; mas se é Baal, segui a Baal” (1Rs 18,21).
Preguiça, covardia, desrespeito humano provocam “decepção” em Deus. Como essa conduta é diferente da dos fervorosos cristãos das catacumbas. Eles padeceram escárnios, zombarias, perseguições, martírio porque viviam autenticamente a fé que professavam e isso atraía tanto para a conversão como para morte.
Prestemos atenção: muitas vezes podemos nos iludir assumindo a fé à nossa maneira, segundo os próprios gostos, com uma interpretação liberal da verdade, com apego às próprias ideais em contraposição ao mistério revelado.
O que pensam nossos inimigos do comportamento que temos em relação à fé que professamos, da ética-moral que praticamos, da Igreja que expressamos e vivenciamos? Nós os estamos confundindo, edificando ou escandalizando?
Artigo de autoria do Padre José Alem, cmf.
Texto extraído da seção “Espiritualidade” da Revista Ave Maria – Edição Março/2017.
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