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No coração da vocação da Igreja no mundo está a proclamação do Reino de Deus inaugurado em Jesus, o Senhor crucificado e ressuscitado. E, na missão de proclamar a Palavra, são os desafios que nos alertam para a renovada reafirmação da identidade cultural nos diversos lugares, especialmente quando se observa a pluralidade das práticas religiosas. Esses ambientes exigem do evangelizador capacidade para estabelecer um relacionamento de diálogo com outras pessoas no sentido de discernir as insondáveis riquezas de Deus e a maneira como ele lida com a humanidade. É preciso ter a clareza de que o Espírito de Deus atua constantemente em de maneiras e formas que vão além do entendimento humano e nos lugares em que menos se espera.
Nesse sentido o catequista se encontra diante de importantes paradigmas em suas missão: encarnar o evangelho no âmbito de cada cultura, viver em comunidade, testemunhar e dialogar, ou seja, testemunhar a própria fé, mas entendendo as várias formas pelas quais Deus cumpre seus propósitos.
Deus é o anfitrião da salvação e a salvação pertence a Ele. A nós, cabe participar desse projeto divino. Nós não oferecemos a salvação, mas damos testemunho dela. Não decidimos quem será salvo, pois isso compete À Providência Divina. Nossa tarefa missionária é proclamar a Palavra de Deus, que nos capacita para discernir os sinais do cumprimento dos propósitos de Deus. Abrimo-nos, assim, a uma cultura de diálogo e solidariedade, mas sempre atentos para reconhecer as limitações humanas e da linguagem que tornam impossível esgotar o mistério da salvação que Deus oferece à humanidade. A salvação é uma “hospitalidade” eterna de Deus. Foi Ele que decidiu fazer de nós um povo portador da sua promessa. O próprio Deus nos escolheu para sermos seus servos, não de forma facultativa, mas como dever de justiça, de justiça divina, porque Deus é justo.
A questão do diálogo
A realidade plural em que vivemos, das diversas formas de pensar e viver a fé, nos convoca para o diálogo, sem que isso implique a perda da própria identidade. Pois, quando somos conhecedores da nossa própria tradição religiosa, conhecemos as identificações como valores, normas, ideias, modelos, heróis, nos quais a pessoa, e a comunidade se reconhecem e trabalham as questões de fé, esse reconhecer-se nessa realidade propicia o reconhecer-se com o outro e nesse reconhecimento de si mesmo e do outro, passa a existir a possibilidade do diálogo com benefícios para aqueles que se abrem ao outro. Isto porque ao abrir-se ao diálogo com o outro, sendo conhecedor de sua tradição, da revelação do amor de Deus à humanidade e tendo feito sua escolha histórica de fé sem excluir a sua presença transcendente em outras tradições religiosas, ou até mesmo, nas diversas práticas e crenças, o diálogo abre perspectivas para aprender com o outro, amplia sua identidade que se coloca em constante construção.
Descobrir os mistérios da pessoa de Jesus e o mistério do Reino
Toda essa nossa conversa sobre identidade pessoal, comunitária e diálogo possível nas diversas formas de vivência da fé tem sentido quando nos reportamos para o sentido e significação de ser iniciado na fé. Essa reflexão irá nos ajudar quando tomamos a consciência de que descobrir os mistérios do Reino de Deus, assumir os compromissos do caminho que nos propõe Jesus, viver a mística da moral cristã, tudo isso são realidades muito exigentes, e sem um verdadeiro processo de iniciação não se alcança seu verdadeiro sentido.
O processo de evangelização ao qual somos chamados a viver e levar em missão para as crianças, jovens e adultos, e até mesmo para as pessoas que, embora tenham recebido os sacramentos de iniciação, não foram evangelizados na experiência vivencial do mistério, exige de nós um envolvimento maior com a formação de cristãos que assumam de fato o projeto do Reino e uma revalorização dos itinerários que percorremos na tentativa de contribuir com uma participação maior das pessoas no mistério da fé cristã que gere identidade pessoal e que seja integrada num estilo evangélico de vida.
O valor do mistério de Cristo e da Igreja, explicados nas catequeses e experimentados nas celebrações necessitam de ser hoje explicados dentro de uma vivência marcada pelo rito através das catequeses mistagógicas, vivenciais. Estas experiências marcam a pessoa por inteiro e possibilita maior interiorização.
A iniciação não é uma invenção cristã. Ela está na raiz de muitas religiões na antiguidade e, mais ainda, na raiz de quase todas as culturas. Antes de ser uma realidade religiosa, é uma realidade antropológica. Daí a dificuldade que se tem da vivência do mistério, pois por ser uma realidade antropológica, o ser humano necessita de se deixar abrir ao mistério, criar suas identidades, mas sabedor da existência de um Deus que transcende, que vai além das nossas compreensões, que nos exigem diálogos que podem ser entre eu comigo mesmo, eu e Deus, eu e a natureza, eu e o outro. O diálogo ajuda no enfrentamento dos desafios que nos interpelam, atrai, questionam nossas certezas, coloca medo, mas nos possibilitam o ir além e ampliar a profundidade do mistério no qual somos inseridos, o mistério da nossa fé.
Por Neuza Silveira de Souza – Comissão bíblico-catequética do Regional Leste 2 da CNBB, via Catequese Hoje
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