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Ainda hoje os sonhos nos intrigam. Os antigos achavam que eram manifestação dos deuses, que vêem melhor e mais longe, indicando-nos para onde caminhamos e o que nos vai acontecer. Muitas práticas de adivinhação e previsão do futuro ainda recorrem aos sonhos e à sua interpretação.
Na Bíblia, os sonhos vêm de Deus e somente ele os interpreta autenticamente pela boca de seus eleitos: seus profetas e seus sábios.
Dentre os filhos de Israel, José era sonhador. O pai o preferia, por ser o primogênito de Raquel, a mulher que mais amara, e talvez por pressentir sua intimidade com Deus. Mas os outros dez irmãos mais velhos o invejavam. Começaram a odiá-lo, quando seus sonhos o colocaram em evidência: ele os vira em sonho, prostrados, a adorá-lo.
Um dia, o velho pai Israel pediu-lhe que fosse se encontrar com os irmãos, que haviam levado os rebanhos ao pasto. José os encontrou em Dotaim, mas eles o aprimoraram numa cisterna e acabaram vendendo-o como escravo a mercadores que iam para o Egito. Pegaram sua túnica e mancharam-na com o sangue, para devolvê-la ao pai, como prova da morte do filho preferido. “Nunca mais se ouvirá falar nesse sonhador” – pensaram os irmãos.
Como escravo no Egito, José acabou na prisão, mas continuou sonhando e interpretando sonhos. Até que um dia lhe coube decifrar um sonho duplo do faraó: 7 anos de abundância precederiam 7 anos de carestia. Muita prudência seria preciso para fazer reserva no tempo das vacas gordas e de espigas granadas, recomendou José, para o que comer no tempo das
vacas magras e das espigas vazias.
Entusiasmado com a sabedoria desse hebreu, o faraó o constituiu ministro da economia. Durante 7 anos, José armazenou tanto trigo que até perdeu a conta. Mas quando começaram os anos de carestia, vinha gente de todo o mundo comprar grãos de José, encarregado de administrar o estoque.
Vieram também seus irmãos, que não o reconheceram sob o nome de Safenat-Paneac, que havia adotado no Egito. Forneceu-lhes trigo, mas devolveu o dinheiro. Reteve, entretanto, Simeão, como refém, para garantir que, no ano seguinte, trariam seu irmão menor, Benjamin, filho, como ele, de Raquel.
Uma das cenas mais emocionantes da Bíblia é a de Safenat-Paneac, no ano seguinte, não conseguindo conter a emoção diante do caçula e se revelando como José aos onze irmãos apavorados. Caíram os véus. Os sonhos haviam se confirmado. Era uma extraordinária manifestação de Deus: Javé se servira da maldade fratricida, para garantir a sobrevivência da aliança e manter vivo o fio da promessa feita a Abraão.
Enquanto os irmãos se embaraçavam com mil desculpas, reconhecendo seus crimes, José lhes demonstrava que Deus utilizara sua vileza, para ir realizando a obra de sua graça: “Deus me enviou antes de vocês para que possam sobreviver nesse país, salvando-lhes a vida, em vista de uma libertação maravilhosa. Portanto, não foram vocês que me mandaram para cá. Foi Deus (Gn 45, 7s).”
Tudo contribui para o bem daqueles que Deus escolhe, até mesmo a inveja, o ódio ao irmão e o fratricídio simulado. Deus escolhe as crianças desarmadas e inocentes, como José, para ser testemunhas da salvação, e as conduz por sonhos e contradições, como colaboradores na realização dos seus desígnios de liberdade.
Como Deus quer salvar todos os homens, a História, por mais contraditória que pareça, é o caminho de Deus. Através até mesmo do pecado, Deus realiza seu desígnio de amor conosco e com todos os homens. Feliz culpa, como canta a liturgia da sexta-feira santa.
Fonte: Catequisar
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