“O Senhor me deu o dom inestimável de regenerar para Ele, com a minha obra, muitos povos e de levá-los à plenitude da vida cristã.”
São Patrício, o apóstolo da Ilha Verde
17 de março
Patrício não nasceu na Irlanda; pelo contrário, o primeiro encontro com aquela belíssima terra foi para ele muito desagradável. Tinha apenas dezesseis anos quando os piratas o levaram da Grã-Bretanha, sua terra, e o venderam como escravo nas costas nórdicas da Ilha Verde a um desconhecido, talvez um chefe de tribo.
Um sonho desfeito
Foi o período mais duro de sua vida. O seu pensamento retornava continuamente à casa paterna, à mãe, uma cristã autêntica, e ao pai, diácono da comunidade de Bannhaven Taberniae, onde Patrício nasceu em 385 e onde tinha recebido uma educação muito esmerada. Talvez naquele período tenha pensado em dirigir uma comunidade cristã como o pai ou em se tornar monge para difundir o Evangelho, mas então o tempo dos sonhos tinha tragicamente acabado! Sim, encontrava-se em terra estrangeira, no meio de um povo que até o momento não era cristão, do qual não entendia uma palavra e passava o dia todo cuidando dos animais, coisa que jamais tinha feito em toda a sua vida.
Por duas vezes tentou fugir, mas inutilmente. Terá duvidado de que talvez Deus o quisesse naquelas terras e no meio daquele povo? Mas, à medida que se adaptava aos costumes de seus patrões e aprendia sua língua, descobria com surpresa que não eram assim tão rudes como lhe parecia no início. Também a organização tribal revelava qualquer coisa de nobre e os relacionamentos entre as famílias e entre as tribos eram fundamentados no respeito recíproco.
Certamente que lhes faltava a fé cristã, adoravam ainda os ídolos, mas o que ele poderia ter feito sozinho e sem nenhuma experiência nesse campo? E, depois, ele não era sempre um pobre escravo? Que sentido tinha a sua permanência nesse país estrangeiro? Precisava então fugir a todo custo. Organizou pela terceira vez um plano de fuga e dessa vez ele conseguiu perfeitamente. Havia seis anos que estava longe de casa.
À escola de São Germano
Não sabemos se o navio o repatriou ou se o deixou nas costas francesas. Sabe-se com certeza que num determinado momento Patrício apareceu em Auxerre, junto ao bispo São Germano (+ 448), homem de profundo conhecimento de ciência e de grande santidade que, por sua vez, estivera na Inglaterra para restabelecer a paz naquela Igreja perturbada pela heresia pelagiana.
São Germano acolheu com muita satisfação o jovem britânico e ouviu com interesse a descrição das suas peripécias. Ali descobriu o dedo da Providência. Quem, melhor do que ele, que conhecia por experiência pessoal a língua e os costumes dos celtas e dos escoceses – como eram chamados os irlandeses – poderia levá-los à fé cristã? É verdade que o Papa Celestino já tinha mandado um bispo para a Irlanda, mas este não tinha conseguido entrar no coração daquela gente.
A ideia não desgostou a Patrício, que, depois de ter completado em Auxerre a sua formação cristã e cultural sob a direção do santo bispo, esteve por um tempo em Lérins, centro monástico de fama europeia, defronte à Provença, onde mergulhou com todas as suas forças na vida monástica, convencido de que só com esse carisma poderia plantar a Igreja de maneira duradoura entre os povos da Irlanda.
Tendo vivido com eles por seis anos, tinha notado que havia uma grande diferença entre a psicologia dos habitantes das ilhas, juntos em uma mesma cultura mais familiar e mais estática, e a dos habitantes do continente, continuamente imersos em acontecimentos históricos e mais movimentados e com mais fôlego. Por isso quis visitar os numerosos pequenos mosteiros das ilhas do mar Tirreno, em frente à atual Toscana, e ver com os próprios olhos o método adotado pelos monges para cristianizar os habitantes das ilhas.
O evangelizador da ilha
Naquele período, teria visitado Roma e falado com o Papa? É possível, mas não o sabemos com certeza. Ao contrário, sabemos com segurança que no ano de 432, com a morte de Palladio, o primeiro bispo da Irlanda, Patrício foi nomeado seu sucessor e ele partiu o mais rápido possível com um grupo de monges rumo à sua missão. Estabelecendo-se em Armagh, começou a preparar seus planos.
A Irlanda, de modo diverso da Inglaterra, não tinha conhecido o domínio romano e, portanto, não havia naquela ilha nenhuma estrutura social sobre a qual basear-se para iniciar a evangelização. Seus habitantes eram subdivididos em clãs, bem unidos internamente e bem diferentes entre si. Tinham cultura e organização tribal próprias, às quais eram muito apegados.
Patrício aproximou pessoalmente os chefes dos clãs, favorecido pelo fato de que conhecia bem sua língua e costumes. Mostrou-lhes a sua primeira abadia e propôs-lhes construir outras para servir sua gente. Fez-se ajudar por eles na construção e os fez corresponsáveis também pela manutenção. Não lhe foi difícil enchê-las de jovens irlandeses educando-os com a ajuda de seus monges.
Os chefes, respeitados nos seus cargos, foram os primeiros a abraçar a fé, arrastando consigo o próprio clã. As abadias se multiplicavam e ao redor surgiam as habitações dos chefes e do povo, embriões das futuras cidades.
Os monges, sob a sábia direção de Patrício, conseguiram englobar na fé cristã tudo o que a religiosidade anterior continha de positivo, deixando de lado o que por sua vez era inconciliável. Essa capacidade genial de Patrício de se identificar com a alma irlandesa e de compreendê-la até o fundo explica por que a pregação da nova fé não teve nenhum mártir naquela terra, mesmo que seus habitantes fossem um povo de guerreiros e frequentemente em luta entre si. Assim, a cultura monástica conseguiu encarnar-se na vida daquele povo generoso e altivo sem provocar traumas com o seu passado.
Patrício escolhia entre os jovens do lugar seus monges e padres. Entre eles, não havia muita diferença, pois os monges sacerdotes exerciam com empenho o ministério pastoral e os padres diocesanos viviam com prazer com os monges ao redor do seu bispo. Este, por sua vez, ou era o abade ou o monge escolhido pelo mesmo abade e, portanto, entregue à sua responsabilidade. Sobre todos estava a figura paterna e carismática de Patrício. Ele percorria a ilha em todas as direções para visitar os mosteiros e as dioceses sob sua responsabilidade e para que fossem sempre o centro da vida evangélica à altura de seu carisma e missão.
Nos últimos dias de sua vida, contemplando a obra que Deus tinha realizado na ilha, exclamava comovido: “De onde me veio esta sabedoria, que antes eu não tinha? Eu não sabia nem mesmo contar os dias, nem era capaz de amar a Deus. Como então me foi dado um dom assim tão grande e salutar, como este de conhecer a Deus e de amá-lo? Quem me deu forças para abandonar a pátria e os meus pais e rejeitar as honras que me foram oferecidas e vir a pregar o Evangelho para o povo da Irlanda, suportando os ultrajes dos incrédulos e a infâmia do exílio, sem contar as numerosas perseguições e até mesmo as correntes da prisão e o cárcere? Assim, eu sacrifiquei minha liberdade pela salvação dos outros! Se não sou digno, estou pronto também para oferecer, sem hesitar e com muito prazer, minha vida pelo seu nome. Se o Senhor me der a graça, desejo consagrar as minhas forças a esta causa”2.
Patrício terminou sua vida em paz em Ulster, em 461, em Down, cidade que se chamaria Downpatrick (cidade de Patrício). Sua missão já se podia dizer cumprida, pois ninguém até hoje conseguiu arrancar o cristianismo do coração dos habitantes da Ilha Verde.
Referências no rodapé da página
Texto captado da edição de março da Revista Ave Maria. Para ler os conteúdos na íntegra, clique aqui e assine.
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