Quem neste mundo não gostaria de ter um amigo que estivesse diariamente ao seu lado, pronto para atendê-lo a qualquer hora do dia ou da noite, em qualquer situação, mesmo nos perigos e, concomitantemente, o alegrasse, fortalecesse e estimulasse nas horas de provação e dificuldade?
Com efeito, Deus, em sua infinita bondade e misericórdia para com o gênero humano, destinou para cada homem um anjo da guarda, que, constantemente, vela por cada um individualmente. Sim, é ele nosso companheiro nesta vida e na eternidade.Entretanto, ele é um “amigo” discreto que, apesar de não se revelar, admoesta, ensina, ajuda, acode e inspira de muitas maneiras: ora, por um sopro, ora por um conselho, ora por algum fenômeno natural. Basta que estejamos atentos a suas inspirações.
Mas, como são os anjos? Os anjos são espíritos puros, inteligentes, cheios da graça divina desde o início de sua existência, na aurora da primeira manhã da criação. Distribuídos e ordenados por Deus em nove coros – Serafins, Querubins, Tronos, Dominações, Virtudes, Potestades, Principados, Arcanjos e Anjos – constituem o exército da celeste Jerusalém e receberam a tríplice missão: de perpétuos adoradores da Santíssima Trindade, executores dos divinos desígnios e protetores do gênero humano. 1 Pertencem ao sexto plano da criação, sendo por isso superiores aos homens. Quando foram criados, Deus infundiu-lhes o conceito das coisas universais, sem o qual eles não seriam capazes de conhecer as coisas particulares. Para “ver” algum objeto, o anjo aplica sua inteligência, conferindo com aquele conceito universal que já existe em seu intelecto. Os anjos têm o seu ser por participação no Ser divino. Eles não existem desde sempre, mas em determinado momento receberam a existência, tendo sido criados do nada.2
Os anjos estão organizados em uma hierarquia escalonada verticalmente, diferentemente dos homens, na qual uns dependem dos outros. Cada anjo é uma espécie única; por isso, quanto mais elevado é o anjo, superiores são os conceitos infundidos por Deus. Contudo, isso não causa tristeza ao que é inferior, porque as capacidades, apetência e glória de cada um são plenamente satisfeitas pelo próprio Criador quando entram na Visão Beatífica. Não há sentimento de infelicidade, pois os superiores são motivo de admiração dos inferiores.3
Ensina a teologia que todo criança, no momento do nascimento, recebe de Deus um Anjo da Guarda que vela por ela desde os primeiros momentos da vida até a morte. “Desde o inicio até a morte, a vida humana é cercada por sua proteção e por sua intercessão” e São Basílio completa que “cada fiel é ladeado por um anjo como protetor e pastor para conduzi-lo à Vida” (CEC 336).
Todavia, a nossa vida na terra bem pode ser definida como uma luta, pois viemos a este mundo para enfrentar uma existência tisnada pelo pecado e repleta de dificuldades. Só receberemos o prêmio da bem-aventurança eterna se soubermos corresponder às graças recebidas.4 Não há como escapar. A prova é posta no caminho de todos os seres inteligentes até mesmo os anjos. Contudo, como passar pela prova sem ser ‘reprovado’? Porque além das concupiscências, há ainda o demônio que constantemente nos atormenta com suas farsas, procurando perder as almas. Como defender-se?
Assim como na grande batalha havida no Céu, São Miguel levantou o brado de guerra – “Quem como Deus?” – e dispersou do Céu a Lúcifer e todos seus sequazes, assim também cada anjo da guarda afugenta satanás e impede que sejamos arrastados. Embora de forma invisível, ele está real e verdadeiramente presente ao nosso lado, sendo o nosso guardião nas horas de tentação ou perigos e aquele que leva as orações ao trono de Deus, como uma trombeta que amplia o som de nossas preces, purifica-as, tornando-as mais belas e agradáveis a Deus.5 Porém, ele é discreto e quer nossa colaboração e atenção à suas inspirações.
Não são raros os casos em que os anjos aparecem para livrar seus protegidos de grandes riscos ou confortar nas aflições. Conta-se que São Policarpo, discípulo de São João Evangelista, viajava para a cidade de Esmirna, da qual era bispo, juntamente com um companheiro. No caminho, foi preciso que parassem numa hospedaria a fim de descansarem da viagem. Entretanto, no silêncio da noite, o bispo é despertado por uma misteriosa voz que dizia que a casa ia desmoronar. São Policarpo, sem titubear, levantou-se rapidamente, acordou seu companheiro que não muito convencido, recusou-se a sair. Nesse momento, apareceu o santo anjo da guarda de São Policarpo ordenando que saíssem imediatamente daquele lugar. Obedeceram, e logo que os dois se encontraram fora, desabou a casa num grande estrondo!
Que tal pensamento contribua para aumentar nossa devoção aos santos anjos, esses gloriosos intercessores celestes, dos quais muitas vezes nos esquecemos, e estejamos convictos de que, em qualquer necessidade e tribulação, ali está ele para interceder por nós e levar-nos ao termo final de nossa missão.
Por Ir. Rita de Kássia C. D. da Silva, EP
(Do Intituto Filosófico-Teológico Santa Escolástica)
1 Cf. SÃO TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica. I. q. 108, a. 5.
2 Idem.. I, q. 50, a. 2, ad. 3.
3 GOYARD, Pe. Louis. Os anjos falam? In: Revista Arautos do Evangelho. Ano IX. n.106. São Paulo: Abril. Out 2010, p. 33.
4 Op. Cit SÃO TOMÁS DE AQUINO. I, q. 64, a.2.
5 Cf. SOARES CORREA, Carlos Alberto. O maravilhoso mundo dos anjos. In: Arautos do Evangelho. Ano II, n. 14. São Paulo: Gráfica. Fey. 2003. p. 34-37.
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