Rogério Bellini tinha 8 anos quando descobriu sua vocação. Paulista de Sorocaba, ele foi convidado por amigos mais velhos para assistir à Primeira Eucaristia deles e a participar da coroação de Nossa Senhora. Chegando lá, o garoto recebeu uma vela e a orientação de subir até o altar, acendê-la no círio e, em seguida, rezar uma Ave-Maria ao microfone. Como ainda não sabia rezar, tentaram ensiná-lo na hora. Não deu certo. Nervoso, Rogério não conseguia memorizar a oração. Com medo de passar vergonha, saiu correndo e se escondeu atrás de um carro na porta da igreja. Dali a pouco, sentou-se no último banco. Ficou assistindo, tristonho, aos amigos jogarem pétalas de rosas sobre a imagem de Nossa Senhora. Quando a Missa terminou, a catequista perguntou por que ele tinha ido embora. “Tive medo”, respondeu o menino, encabulado. “Medo de quê?”, quis saber a catequista, com um sorriso. “De conversar com Deus?”, disse ele. “Foi ali, aos 8 anos de idade, que prometi a mim mesmo que aprenderia a rezar e me tornaria catequista para que nenhuma outra criança tivesse medo de conversar com Deus”, recorda Rogério, hoje com 49 anos.
Aquele menino que não sabia rezar cresceu e cumpriu sua promessa de se tornar catequista. Hoje, ele é formado em Psicologia e frequenta a Paróquia São Benedito, da Arquidiocese de Sorocaba. Mais do que isso: é autor, também, de livros de catequese. Um deles, inclusive, foi lançado pela Editora Ave-Maria: Catecriança: propostas para dinamizar a catequese com crianças. Para Rogério, uma das dificuldades enfrentadas pelos catequistas do século XXI é acompanhar o ritmo acelerado da vida moderna. Enquanto a ciência e a tecnologia evoluem na velocidade de um carro de Fórmula 1, a catequese procura acompanhar essas transformações num ritmo lento, “como um carro puxado por bois”. “A formação de novos catequistas é algo que me preocupa. Ninguém nasce catequista. Precisamos cuidar da nossa formação”, avisa Rogério. “Ser uma pessoa engajada na paróquia, ter um espírito de serviço e alimentar sua vida na Palavra de Deus são as maiores virtudes que um bom catequista precisa ter”, ensina.
Como disse Jesus, “a colheita é grande, mas os trabalhadores são poucos” (Lc 10,2). Existem hoje no Brasil cerca de 800 mil catequistas.
A estimativa é da Comissão para a Animação Bíblico-catequética, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). “Infelizmente, com a pandemia, muitos desistiram da missão”, lamenta o Padre Jânison de Sá Santos, assessor da comissão, que acrescenta: “Muitas dioceses estão fazendo uma grande promoção vocacional para conquistar novos catequistas”. Porém, não é todo e qualquer católico, pondera o sacerdote, que está apto a ser catequista. Ter vocação é fundamental! “O catequista é alguém que se sente chamado por Deus para exercer a missão de catequizar, ou seja, de transmitir a fé cristã às novas gerações. Em primeiro lugar, precisa ter dom para assumir esse ministério e, em segundo lugar, passar por formações pedagógicas, bíblicas e teológicas para exercer essa missão com qualidade”.
Etimologicamente, a palavra “catequista” deriva do latim “catechista” e do grego “katekhistes” e significa “aquele que instrui na religião”. Em geral, os catequistas iniciam sua formação após receberem o Sacramento da Crisma, por volta dos 15 anos. Durante algum tempo, exercem o ministério como colaboradores de um catequista mais experiente. Não há limite de idade. Padre Jânison já conheceu uma catequista de 87 anos, “muito lúcida e atualizada”.
Natural de Ponta Grossa (PR), Flávia Carla Nascimento já era adulta quando se sentiu chamada por Deus. À época, tinha 23 anos, era formada em Odontologia e trabalhava como cirurgiã-dentista. Mesmo assim, precisava dar um sentido à sua vida. “Havia um vazio no meu coração”, admite. Foi quando começou a rezar e pediu a Deus que lhe mostrasse um caminho. Já no domingo seguinte, o padre avisou, ao fim da Missa, que precisava de novos catequistas. Hoje, aos 48 anos, faz parte do Instituto Secular Servas de Jesus Sacerdote, frequenta a Paróquia Sant’Ana e coordena a Pastoral de Animação Bíblico-catequética da Diocese de Ponta Grossa. À frente da pastoral, lançou Manual para catequese com adultos – iniciação à vida cristã: formando discípulos missionários, pela Editora Ave-Maria. “Catequizar adultos não é mais fácil ou mais difícil do que crianças e jovens. Cada fase tem suas alegrias e dificuldades”, pondera Flávia. “Diante do anúncio do Evangelho, nem sempre encontramos corações disponíveis para acolher a Palavra de Deus, mas, não podemos desanimar. É um desafio encantador porque os adultos têm potencial de se tornarem discípulos missionários. Não podemos desperdiçar a chance de levá-los a um encontro transformador com o Senhor”, finaliza.
Quando criança, toda vez que alguém lhe perguntava o que queria ser quando crescesse, Thaís Rufatto dos Santos, de 39 anos, não pensava duas vezes: “Catequista”, respondia ela. Não é para menos. Thaís é filha e neta de catequistas. Em 2004, criou o conceito de catequese inclusiva e, em 2013, publicou o livro Catequese inclusiva: da acolhida na comunidade à vivência da fé, pela Editora Paulinas. Por quase nove anos, de 2004 a 2013, coordenou a Pastoral da Pessoa com Deficiência da Diocese de Santo Amaro (SP). Paralelamente, formou-se em Pedagogia. Ao longo de sua caminhada catequética, levou a Palavra de Deus a portadores de necessidades especiais, como crianças e jovens com síndrome de Down, transtorno do espectro autista e paralisia cerebral, entre outros. Indagada se a catequese inclusiva impõe algum tipo de desafio ao catequista, Thaís responde que sim: não ter medo de lidar com o desconhecido. “O catequista não precisa sentir-se inseguro para evangelizar as pessoas com deficiência. Em cada deficiente físico, auditivo ou visual, está estampado o rosto de Jesus excluído da nossa sociedade”, afirma.
Catequistas do Brasil inteiro, como Rogério, Flávia e Thaís, ganharam um “presente” do Papa Francisco. Desde o dia 11 de maio de 2021, quando o Santo Padre publicou a Carta Apostólica Antiquum Ministerium (Ministério Antigo), a catequese ganhou status de ministério. “A instituição do Ministério do Catequista foi um presente do Papa Francisco. Um presente que motiva e valoriza a figura do catequista”, explica o Padre Jânison, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil . “A catequese não será apenas mais uma missão confiada pelo pároco. A partir de agora, terá caráter institucional”, diz.
Os catequistas Regina de Sousa Silva e Wanderson Saavedra Correia, da Diocese de Luziânia, em Goiás, não vão esquecer tão cedo do dia 23 de janeiro de 2022. Nesse domingo, o terceiro do Tempo Comum, os dois receberam, das mãos do Papa Francisco, na Basílica de São Pedro, em Roma, Itália, o ministério do catequista. Regina frequenta a Paróquia Nossa Senhora de Fátima, no Jardim Céu Azul, e Wanderson, a Paróquia Nossa Senhora Aparecida, em Luziânia. O convite para representarem catequistas não só do Brasil, mas de todo o continente americano, partiu do bispo de Luziânia, Dom Waldemar Passini. “É preciso ser catequista e não simplesmente dar catequese. Nosso testemunho é mais importante do que nossas palavras”, afirma Wanderson, repetindo a exortação do Papa Francisco. “Catequese não é um trabalho voluntário que o catequista faz quando quer. É um compromisso assumido com Deus, com os pais de crianças e adolescentes, com jovens e adultos e com a sua missão”, completa Regina, lembrando das palavras de Dom Afonso Fioreze (1942-2021), bispo emérito de Luziânia.
Não basta ter vocação e dizer “sim” ao chamado de Deus. É preciso cuidar de sua formação catequética. “A Bíblia e o Catecismo da Igreja Católica devem ser os nossos livros de cabeceira”, sublinha Wanderson. “A doutrina e a espiritualidade precisam caminhar juntas, de mãos dadas”, arremata Regina.
Desde fevereiro de 2019, a pedagoga Kiara Castro, uma das principais organizadoras de eventos católicos do Brasil, promove encontros nacionais com o objetivo de capacitar catequistas. As três edições do Catequistas Brasil reuniram um público estimado de 10 mil pessoas. A quarta edição está agendada para os dias 3 a 5 de fevereiro de 2023, no Santuário Nacional de Aparecida (SP). “São três dias de muitas palestras, oficinas, espiritualidade e formação”, avisa Kiara, que pontua: “Todos os anos, temos mais e mais catequistas motivados a seguir a missão de ser verdadeiros discípulos e missionários”.
Já Altierez dos Santos, o fundador da comunidade Catequista em Missão, ensina os catequistas do século XXI, por meio de cursos e vídeos, a como evangelizar nas redes sociais, entre outros desafios. “Falar de Deus em tempos digitais ficou ao mesmo tempo mais fácil e mais difícil. Mais fácil porque temos novas janelas por onde anunciar Jesus e mais difícil porque precisamos aprender novas formas de comunicação. Mais do que nunca, precisamos de criatividade e dedicação”, afirma.
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