A experiência da misericórdia divina é um dado irrenunciável da mensagem de Jesus Cristo no Novo Testamento. Ele anuncia a presença de Deus e a disponibilidade de Seu perdão. Na verdade, o próprio Jesus é a presença de Deus e o Seu perdão entre nós. Neste sentido, podemos dizer que o conteúdo do anúncio e a pessoa que o anuncia se identificam em Cristo: Ele anuncia Deus e Seu perdão e é, ao mesmo tempo, o Deus misericordioso entre nós.
Os antigos cristãos, renascidos para uma vida nova em Cristo pelo Batismo, consideravam com grande seriedade a vida na amizade com Deus, ou seja, a vida no que chamamos de “estado de graça”. A prática penitencial dos primeiros séculos era realmente severa e irreiterável, indicando a seriedade da infidelidade a Deus e do nosso pecado.
Esta seriedade foi, aos poucos, sendo compreendida com maior profundidade, ao ponto de se chegar à prática penitencial que conhecemos em nossos tempos: sempre haverá um sacerdote, como pastor, médico e juiz, para nos acolher no tribunal da misericórdia divina. Ali, ao reconhecermos nossos pecados e confessá-los com sincero arrependimento, temos a oportunidade de contemplar o nosso bom pastor levando a ovelha de volta para o redil, a levar a ovelha de volta para casa.
Acontece, não raras vezes, que os fiéis com consciência malformada participam da celebração do sacramento da Reconciliação com indisposição: sem o preparo devido, sem o sincero arrependimento, sem o verdadeiro propósito de mudança de vida. Ademais, por vezes tem-se uma abordagem muito subjetivista desse sacramento, perdendo-se as oportunidades de vivência eclesial do mesmo.
No mês anterior, vivenciamos inúmeras experiências de “mutirão de confissões” em nossas dioceses. Quantas oportunidades para todo o povo de Deus estar bem disposto para a celebração anual da Páscoa! No entanto, muitos, por negligência ou outro motivo, deixaram para se confessar nos últimos dias e, em alguns casos, não tiveram a feliz oportunidade de experimentar a reconciliação sacramental com Deus e com a Igreja.
Tudo isso nos deve levar a uma séria reflexão: como temos conduzido a nossa vida espiritual? Com que centralidade e seriedade vivemos a nossa fé? Temos priorizado nossas relações com Deus, com a Igreja e com os irmãos? Ou, pelo contrário, negligenciamos estas realidades fundamentais em nossa vida e postergamos ou procrastinamos nossa experiência com o amor e a misericórdia divina?
O Papa Francisco, dentre tantos pensamentos belos a respeito da confissão sacramental, afirma que […] no coração de Deus, nós estamos antes dos nossos erros. Rezemos para que vivamos o sacramento da reconciliação com profundidade renovada, para saborear o perdão e a infinita misericórdia de Deus.
É justamente isso que somos convidados a meditar: temos vivido o sacramento da reconciliação com profundidade? Viver a reconciliação sacramental com profundidade renovada: eis aqui a nossa tarefa para este mês!
*Padre Thales Maciel Pereira é doutorando em Teologia Sistemático-pastoral pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). Pela mesma instituição é mestre em Teologia e cursa especialização em Filosofia Antiga. É professor de Teologia nas faculdades Dehoniana e Canção Nova.
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