É comum que a linguagem religiosa assuma elementos do seu meio cultural para expressar algumas compreensões próprias da fé, da moral e dos costumes. Basta considerar a história dos dogmas para verificar como conceitos específicos do ambiente pagão, como a filosofia grega, foram considerados adequados para expressar em linguagem extrabíblica aquilo que era o conteúdo próprio das verdades bíblicas.
Para exemplificar, pode-se lançar mão da definição nicena que afirma ser Jesus da mesma natureza (substância) que o Pai para entender como o conceito grego homoousious foi considerado adequado para expressar a relação íntima e filial que há entre Jesus Cristo e Deus, a quem Ele chamava Abbá, Pai.
No entanto, havemos de convir: a linguagem extrarreligiosa não pode ser assumida no âmbito cristão sem uma apreciação crítica. Os conceitos arcaicos sobre a divindade foram amplamente criticados pelo pensamento cristão antigo por meio dos padres da Igreja.
A linguagem secular hodierna possui um vocábulo bastante conhecido. Trata-se da palavra “voluntariado”. Muitos se voluntariam para uma série de trabalhos dignos de nota: assistência a pessoas vulneráveis, auxílio em organizações não governamentais, associações de bairro etc. A noção mesma de voluntariado indica que aquele trabalho nasceu da vontade da pessoa.
Essa linguagem, não raras vezes, tem sido transposta para o ambiente religioso de nossas comunidades cristãs. Muitos cristãos têm dito “Eu sou voluntário aqui!”, “Faço isso por voluntariado!”.
Conquanto, por questões de segurança jurídica, seja importante a assinatura de termos de voluntariado, os leigos atuantes em nossas igrejas não estão ali por mera questão de “voluntariado”, seria empobrecer demais a dimensão teológica do laicato. Todos os batizados estão na igreja não como voluntários, mas, como vocacionados.
São Paulo afirmou a respeito de seu próprio ministério: “Paulo, apóstolo de Jesus Cristo por vocação” (1Cor 1,1). Veja: Paulo não afirma ser apóstolo por voluntariado, mas pela graça do chamado divino. Assim também ocorre com todo e cada cristão: o ponto de partida da vida cristã nunca é a vontade humana, mas, o dom do alto, o chamado divino. A graça de Cristo nos precede sempre.
O Papa Francisco gosta de utilizar o verbo “primeirar” para indicar o fato de que o amor e a escolha de Deus se antecipam a nós. De nossa parte, cabe uma atitude de resposta positiva, de prontidão para o serviço a Deus e aos irmãos. Sendo assim, nunca nos compreendamos como meros voluntários na Igreja. Isso seria pouco e rasteiro demais. Somos bem mais que voluntários: somos vocacionados!
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