Dom Francisco Carlos Bach
Bispo de Joinville (SC)
O mês de agosto, conforme costume da Igreja, é dedicado à oração, reflexão e atividades nas comunidades sobre o tema das vocações. Por isso, lembra-se na primeira semana a vocação para o ministério ordenado (diáconos, padres e bispos), na segunda semana para a vida em família, na terceira semana coloca-se em destaque a vocação para a vida consagrada, e na quarta semana contempla-se a vocação para os ministérios e serviços na comunidade, em especial o catequista.
O amor é o pressuposto básico de toda e qualquer vocação. É dele que decorre a entrega de uma vida a serviço de Deus e do próximo. Estamos conscientes de que a nossa grande vocação é o retorno à casa do Pai, para o feliz convívio eterno com Deus, a fonte de todas as vocações. Mas tal retorno exige uma resposta de amor no dia-a-dia de nosso viver, que se realiza mediante uma vocação específica. Como entender o amor de Deus por nós a fim que esteja presente em nós e possamos torná-lo presente em nosso relacionamento familiar, comunitário e social?
São João Evangelista foi o apóstolo que melhor compreendeu esse amor. Conheceu a interioridade de Jesus, tendo-o acompanhado durante três anos, conviveu com Nossa Senhora, depois da morte do Filho e participou do nascimento das comunidades primitivas. Assim, é dele a melhor definição de Deus: “Deus é amor” (1 Jo 4,8.16). Amor no sentido mais perfeito do termo, pois tal é a essência de Deus. Ele não tem amor, Ele é Amor, por constituição do seu próprio ser. Nesse mistério divino mais íntimo, indescritível para nós, o Pai e o Filho se doam mutuamente, na eterna doação que é o próprio Espírito Santo. E o Amor veio até nós, na pessoa do Verbo eterno encarnado: Jesus Cristo. Este é o grande mistério que nos foi revelado como causa da nossa alegria e base da nossa fé.
A doação divina para conosco se manifesta, em primeiro lugar, na grandiosidade da criação. Tudo decorre do modo de ser de Deus que, num ato de amor gratuito, criou todos os seres visíveis e os entregou ao homem. A nós, ainda, Ele presenteou com o que há de mais precioso: a participação na sua própria vida divina. Deus nos concedeu a graça sobrenatural de sermos seus filhos.
Para nós, seu amor se desdobra em ato afetuoso de Pai, que nos faz filhos no próprio Filho, nosso Irmão. A este somos configurados pelo Espírito de amor, que impregna em nós a sua imagem mais perfeita. O próprio Jesus afirmou: “Se alguém me ama, guardará a minha palavra e meu Pai o amará, e nós viremos a ele e nele faremos nossa morada” (Jo 14,23). Quanto mais nos abrimos ao amor, mais traduzimos tal imagem em nós, pela pureza, pela alegria, enfim, por tudo aquilo que temos de mais nobre e sublime. Portanto, com sua vida, Deus nos dá “graça sobre graça”. Esta se mostra, por exemplo, na bondade. Só Deus é bom. São João Paulo II dizia: “É preciso procurar a face de Deus”. Santa Teresinha o traduz, numa linda expressão: “O amor de Deus consiste em descobri-lo nas pessoas que nos cercam”.
Não nos esqueçamos de que o maior dom do Pai foi nos enviar seu próprio Filho: “De tal modo Deus amou o mundo que lhe deu seu Filho único” (Jo 3,16). Esse “dar” refere-se tanto à entrega na Encarnação, como à entrega dolorosa no sacrifício da Cruz. “Ele não poupou seu próprio Filho, mas por todos nós o entregou” (Rm 8,32). Assim, para irmos ao Pai, passamos sempre pela mediação de Jesus, no Amor Pessoal que Ele tem ao Pai, que é o Espírito Santo.
Somos conduzidos pelas mãos do próprio Cristo à casa e ao amor do Pai. Reconhecer esta verdade do amor de Deus para conosco é essencial à nossa caminhada de fé, na vivência de nossa vocação específica. É um amor pessoal, que nos transforma. Nós é que, muitas vezes, hesitamos em nos entregar a ele, incondicionalmente. Por isso é que o Senhor nos lembra: “Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos”. (Mt 28,20).
FONTE: CNBB
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