Na Quarta-feira de Cinzas inicia-se a Quaresma, tempo forte de preparação para a celebração do mistério pascal. No centro dessa celebração litúrgica encontra-se o gesto simbólico da imposição das cinzas, juntamente com a primeira fórmula presente no rito: “Recorda-te que tu és pó, e ao pó voltarás’’ (Gn 3,19). Referindo a essa palavra [pó], em 26 de fevereiro de 2020, o Papa Francisco disse que “O pó sobre a cabeça faz-nos ter os pés assentes na terra: recorda-nos que viemos da terra e à terra voltaremos, isto é, somos débeis, frágeis, mortais”. Ao mesmo tempo, lembrou o Pontífice que “Somos o pó amado por Deus. Amorosamente, o Senhor recolheu nas suas mãos o nosso pó e, nele, insuflou o seu sopro de vida (cf. Gn 2,7), por isso, somos um pó precioso, destinado a viver para sempre”.
A dignidade da pessoa humana está radicada na sua criação à imagem e semelhança de Deus, ensina a Igreja (cf. Catecismo da Igreja católica, 1700). Isso significa que é dotada não só de racionalidade e liberdade, mas, também, de capacidade, desde o princípio, para uma relação pessoal com Deus, capacidade de aliança, que é comunicada como dom de salvação de Deus ao homem. Ser criado à imagem e semelhança é “o dom do Espírito” ao homem já no princípio da criação. (cf. Carta Encíclica Dominum et Vivificantem, 34).
As cinzas e essa fórmula tirada do Livro do Gênesis aludem à realidade da condição humana, lembram que a caducidade da existência é um convite a considerar a vaidade de cada projeto terrestre, quando não se fundamenta a sua esperança em Deus cf. (João Paulo II, homilia de 13 de fevereiro de 2002).
O convite deste texto, ao trazer uma reflexão sobre a identidade do homem (“Tu és pó”) e sobre o seu destino (“ao pó retornarás”), propõe uma busca de autoconhecimento e uma revisão de vida que gere a conversão. Tal obra desafiadora é o Espírito Santo como “dispensador escondido da força de salvação” que age na conversão interior realizada pela redenção em Cristo (cf. Catecismo da Igreja católica, 1427). Ele é a força de uma “nova criação”: sim, precisamente aquele que dá a vida. Age no interior do homem como “luz das consciências”. Ele penetra e enche as “profundezas dos corações” humanos, “vem em cada caso concreto de conversão-remissão, em virtude do sacrifício da cruz: nele, realmente, “o sangue de Cristo (…) purifica a nossa consciência das obras mortas, para servir o Deus vivo” (Hb 9,14) (cf. Carta Encíclica Dominum et Vivificantem, 2.34.45).
Os mistérios salvíficos da vida de Cristo celebrados na liturgia são sempre um chamado à conversão e a viver a vida nova, dada como “dom do Espírito” oferecido por Cristo, “cuja atividade será toda ela desenvolvida com a presença do Espírito Santo” (BASÍLIO, 2005, p. 136). Após seu Batismo no Jordão, Jesus, cheio do Espírito, é conduzido pelo Espírito Santo ao deserto, sua Quaresma: um caminho de quarenta dias de penitência, jejum e oração; é vivida na ação do Espírito, combate o demônio com a sabedoria da Palavra eterna (cf. Lc 4,1s).
Seguindo o exemplo de Jesus, que você possa viver o Tempo Quaresmal, conduzido pelo espírito da verdade.
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